Análise: Stephen Colbert terá de mostrar a própria cara para substituir David Letterman
De Bill Clinton a Henry Kissinger, de George Lucas a James Franco, de Gloria Steinem a Paul Krugman.
O elenco eclético do coral organizado para a despedida do programa "The Colbert Report", do canal Comedy Central, dá a dica do prestígio do apresentador Stephen Colbert, que passou uma década satirizando a rede ultraconservadora Fox News.
As dezenas de convidados especiais cantaram juntos "We'll Meet Again", clássico britânico da Segunda Guerra Mundial, que já foi interpretado por Johnny Cash e Frank Sinatra, e que tocou ao final de "Dr. Strangelove" (1964), longa-metragem de Stanley Kubrick.
Cindy Lauper, Barry Manilow, Steven Pinker e quase todos os colunistas do jornal "The New York Times" também participaram da cantoria, que foi levada ao ar no último dia 18.
Não se via tanta gente famosa junta cantando desde o "We Are the World", contra a fome na Etiópia, nos anos 1980. Vários sites americanos tiveram a boa ideia de "legendar" o clipe, fazendo um quem é quem de todos os convidados.
A canção, que diz que "nos encontraremos de novo", também serviu de lembrete para os fãs de Colbert. A partir do ano que vem, ele tomará o lugar de David Letterman, o decano dos "talk shows" de fim de noite da TV americana, que se aposenta.
No novo papel, Colbert finalmente poderá assumir a própria identidade, uma incógnita para o público que se acostumou com a sátira em tempo integral.
Em nove anos como apresentador e, antes, como repórter do programa do também humorista político Jon Stewart, Colbert virou uma versão superlativa de Bill O' Reilly, o mais popular âncora do canal Fox News.
A América mais conservadora estava lá: ele chamava seu programa de "fact-free zone" (zona livre de dados), rejeitava qualquer debate sobre mudança climática ou de discussão científica (ou qualquer deixa para se mudar o estrago ambiental da cultura americana) e dizia que não existe mais racismo no país (maneira racista de ignorar o assunto).
O estrelato total de Colbert aconteceu fora dos limites de sua meia hora diária na TV, meses após a estreia do programa, em outubro de 2005.
Ele foi o humorista convidado para abrilhantar o jantar dos correspondentes da Casa Branca em 2006. Diante de centenas de jornalistas e do presidente George W. Bush, o "conservador" Colbert elogiou o mantra do "governo menor" dos republicanos.
"Acredito que o melhor governo é o que governa menos, e, por esse padrão, fizemos um grande trabalho no Iraque", discursou. "Livros são elitistas, não têm coração."
O show televisionado mostrava uma plateia atônita. Bush deixou de rir e fechou a cara. É considerado até hoje o momento de maior constrangimento que um humorista já impingiu a um presidente americano.
Também não poupou a imprensa americana da época. "Vocês foram bem no noticiário das armas de destruição de massa no Iraque, dos cortes de impostos, dos efeitos do aquecimento global. Nós americanos não queríamos saber e vocês fizeram a cortesia de não ir atrás".
Colbert virou porta-voz da frustração com o melancólico final do governo Bush, com o domesticado jornalismo de Washington e soube rir do anti-intelectualismo em alta no país.
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