Indicado ao prêmio, filme sobre Sebastião Salgado reúne sabedoria, técnica e alma
Wim Wenders começou a filmar em preto e branco por acaso. O cineasta, então estudante, descobriu que seu curta, um projeto de graduação da Escola de Cinema de Munique, poderia virar um longa se ele usasse filme em 16 mm preto e branco —mais barato na época. Wenders virou um dos mestres do estilo.
Sebastião Salgado começou a fotografar em preto e branco por opção. Formado em economia, o mineiro poderia ter sido um competente burocrata, mas decidiu arriscar tudo em um equipamento fotográfico e na profissão tumultuada de jornalista na França do fim dos anos 1960. Salgado virou um dos mestres do preto e branco.
Essa pororoca monocromática se encontraria mais cedo ou mais tarde. Wenders já havia comprado originais de Sebastião Salgado e ambos são fanáticos por futebol.
Decia Film/Divulgação | ||
Sebastião Salgado durante o projeto Gênesis em imagem do filme 'O Sal da Terra' |
Veio a calhar que eles formassem dois alicerces do triângulo documental que é "O Sal da Terra", completo com a codireção de Juliano Ribeiro Salgado, filho de "Tião" e companheiro de várias viagens ao lado do pai.
É seguro dizer que o documentário laureado com o prêmio especial do Júri da Mostra Um Certo Olhar, em Cannes, e, agora, finalista do Oscar, não teria tanta qualidade sem qualquer um dos três envolvidos. Sabedoria, técnica e alma se misturam organicamente no filme sobre a realização do projeto "Genesis".
Obviamente, Sebastião Salgado é a força motriz do filme. O fotógrafo brasileiro é carismático, mas tem a rispidez necessária do jornalismo. O que é perfeito para um documentário sobre um homem em busca de explorar o mundo, mas que nunca foi intimamente explorado como sua obra.
Wenders e Juliano entenderam que Sebastião e seu trabalho são um só, impossíveis de serem desmembrados.
Por isso, o documentário enquadra o fotógrafo misturado a suas imagens, sempre contando algum fato impressionante por trás daquele granulado preto e branco.
Seja em Serra Pelada, seja na África, o ponto em comum é um homem aprendendo com suas raízes, mesmo desgostoso de algumas de suas ramificações.
É assim que os dois diretores passam a tratar do Instituto Terra, projeto de preservação ambiental de Salgado e sua mulher, Lélia. De início, não seria surpresa encarar o assunto, que marca o fim de "O Sal da Terra", como uma "rasgação de seda".
Mas, na verdade, marca uma metamorfose de um sujeito incansável e preocupado com o chão onde pisa e mora.
Sebastião Salgado não precisa de tapa nas costas. Wenders não dirige com essa finalidade e Juliano fez do filme uma espécie de terapia familiar para poder remendar a relação distante com o pai. No fim, o documentário emociona sem pieguice e revela as diversas cores de um gênio da fotografia. Mesmo que, na sua maior parte, em preto e branco.
O SAL DA TERRA
DIREÇÃO Juliano Ribeiro Salgado e Wim Wenders
PRODUÇÃO Brasil/França/Itália, 2014, 10 anos
QUANDO estreia prevista no Brasil para a segunda quinzena de março
AVALIAÇÃO ótimo
Livraria da Folha
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