Crítica: Livro simplifica jornalismo em críticas infantis
Há algo de sombrio no romance "A Nova República", de Lionel Shriver, autora do über best-seller "Precisamos Falar Sobre o Kevin". E não é do enredo que vem esse obscurantismo, mas de uma visão arrogante daquilo que o livro, aparentemente, quer criticar.
O assunto é uma organização terrorista chamada "SOB", ou "Soldados Ousados de Barba". "Barba", por sua vez, é um país cuja capital se chama, inacreditavelmente, "Cinzeiro" e cujo braço político tem o nome de "Creme de Barbear".
O país imaginário se situa, não tão surpreendentemente assim, ao sul de Portugal e a língua falada ali, é claro, é o português. Sim, o livro é pretensamente engraçado e esses nomes não foram inventados para soar sérios. Mesmo assim, o leitor se perguntará qual é a graça.
David Levenson/Getty Images | ||
A escritora Lionel Shriver |
Edgar Kellogg é um profissional fracassado que, aproximando-se dos 40 anos, deseja a popularidade. Para isso, se oferece como jornalista numa redação, na tentativa de equiparar-se ao seu ídolo de juventude, o bem-sucedido jornalista Toby Falconer.
Qual não é sua surpresa quando ele é prontamente enviado a Barba, país antes desconhecido, mas atualmente disputado pela imprensa em função de graves atentados terroristas. Para piorar, Barrington Saddler, estrela do jornalismo, desapareceu misteriosamente em Barba e Kellogg deverá encontrá-lo.
Não é necessário que uma trama seja original para que um romance seja bom. Mas aqui, não bastasse o argumento clichê, o leitor deverá suportar 370 páginas de: "almofadas de veludo carmesim tinham se desbotado num rosa doentio, e sua penugem felpuda parecia achatada feito pelo de gato molhado" ou "enquanto galopava pelas ruas, o sedã de para-lamas arredondados entrava e saía da pista, a despeito da luta viril do motorista com o volante".
A Nova República |
Lionel Shriver |
Comprar |
Lionel Shriver escreveu este livro antes do atentado de 11 de Setembro e alega não tê-lo publicado antes porque as editoras, àquela época, não se interessavam por terrorismo e porque a própria autora ainda não era tão conhecida.
Sim, a posteriori é mesmo sempre fácil encontrar razões aparentemente nobres para qualquer coisa, inclusive para o oportunismo. Ademais, a crítica ao jornalismo pretendida pelo romance esbarra em simplificações infantis.
Mas nada disso se compara à visão de um pseudopaís das bananas, grudado a Portugal, onde os terroristas são caricatos, estabanados e, obviamente, falam português.
Cara Lionel Shriver, não precisamos mais falar sobre Kevin. Desta vez, precisamos falar sobre assuntos mais sérios.
A NOVA REPÚBLICA
AUTORA Lionel Shriver
TRADUÇÃO Vera Ribeiro
EDITORA Intrínseca
QUANTO R$ 39,90 (384 págs.)
AVALIAÇÃO ruim "¢
Livraria da Folha
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade
- 'Fluxos em Cadeia' analisa funcionamento e cotidiano do sistema penitenciário
- Livro analisa comunicações políticas entre Portugal, Brasil e Angola
- Livro traz mais de cem receitas de saladas que promovem saciedade