Documentário 'A França é Nossa Pátria' critica política com inteligência
Em "A França É Nossa Pátria", seu primeiro longa após a indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro para "A Imagem que Falta" (2013), Rithy Pahn se desvia do tema que costuma abordar obsessivamente. O regime do Khmer Vermelho no Camboja, seu país natal, dá lugar a outra sorte de dominação: a colonização francesa na Indochina, que se iniciou em 1887 e se estendeu até 1954.
Para tanto, recorre ao mesmo dispositivo de filmes como o russo "Blokada", de Sergei Loznista (2006), ou o romeno "The Autobiography of Nicolae Ceausescu", de Andrei Ujica (2010), documentários montados exclusivamente a partir de imagens de arquivo.
A partir de filmes amadores (oficiais ou domésticos), Pahn costura um autorretrato da elite francesa local revelando como essa elite se vê e vê os "nativos". Hoje, as imagens tomadas pelos próprios colonizadores funcionam como um espelho cruel, sintoma da fracassada tentativa de se construir um discurso positivo (e positivista) para um projeto supostamente "civilizatório".
Rithy Pahn organiza essas imagens de arquivo (que ele chama de "belas e envenenadas") de forma aparentemente serena, interferindo eventualmente com a colocação de entretítulos que explicitam a ideologia reinante na época.
Uma das frases é do doutor Legendre, médico francês que percorreu a região, e que sintetiza o espírito do discurso pseudocientífico que buscava justificar determinadas ações políticas: "Todos os grandes acontecimentos, todas as grandes revoluções da História universal, foram obras da raça branca, a única, entre todas, criadora".
Como em todos os outros filmes de Rithy Pahn, a "serenidade narrativa" é apenas uma camada aparente, que esconde um rico turbilhão de ideias atravessando toda a sutil construção do filme, erguido aqui sobre essa ideia de uma imagem anacrônica e absolutamente transparente, que fala por si mesmo.
No cinema de Rithy Pahn, a crítica política é feita com tal sobriedade e inteligência que se torna muito mais poderosa e contundente do que a de qualquer obra panfletária (que o diga Michael Moore).
FESTIVAL É TUDO VERDADE
p(event-rating). A FRANÇA É NOSSA PÁTRIA
DIREÇÃO: RITHY PANH
PRODUÇÃO: FRANÇA/CAMBOJA, 2014, 14 ANOS
QUANDO: QUI. (16), ÀS 17H NO CINE LIVRARIA CULTURA, EM SP; SEX. (17), ÀS 15H NO OI FUTURO, NO RIO; SÁB. (18) ÀS 17H NO ESPAÇO ITAÚ BOTAFOGO, NO RIO
Livraria da Folha
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