'O Diário da Esperança' sublinha aspecto frio de crianças na guerra
A tragédia da guerra pelo olhar de crianças não é novidade no cinema. Filmes como "Brinquedo Proibido" (1952) e "A Vida É Bela" (1997) reimaginaram os efeitos da destrutividade na perspectiva infantil e tiraram do choque lições de fábula.
"O Diário da Esperança", do húngaro Jánoz Szász, retoma a tradição com irmãos gêmeos buscando sobreviver ao término da ocupação nazista no fim da Segunda Guerra e à chegada das tropas soviéticas.
Na passagem de um invasor a outro, mudam os idiomas, mas a brutalidade apenas troca de lado. Quando não se trata da violência militar, os garotos continuam submetidos à exploração da avó, mulher sem modos e intolerante que os escraviza.
Cada experiência é registrada num diário, no qual os garotos escrevem o que testemunham e o que sonham, a realidade sem retoques e sua transfiguração.
despojamento
O filme baseia-se no primeiro volume da "Trilogia dos Gêmeos", de autoria da escritora húngara Ágota Kristóf. Livro e filme enfatizam o processo da escrita como uma combinação do esforço de sobrevivência com a ação de resistência.
Na obra, Kristóf retoma os moldes do "romance de formação" com uma versão alterada em que a violência e a crueldade deformam a lição moral predominante no modelo original.
O estilo seco e frio da escritora influencia o tratamento pouco emotivo que o Szász injeta no filme.
No lugar do sentimentalismo que abunda nos filmes com crianças em meio a tragédias, "O Diário da Esperança" prioriza o despojamento, mesmo quando os personagens vivenciam ou testemunham situações de choque.
O efeito é como se a brutalidade os anestesiasse aos poucos e, assim, a infância deixasse de ser uma etapa de inocência e revelasse um mundo adulto desiludido e pessimista.
Essa percepção é valorizada pelo trabalho de imagem a cargo de Christian Berger, renomado diretor de fotografia dos filmes de Michael Haneke. Berger recria a degradação em tons sujos e apagados e evita a contradição de procurar a beleza visual onde predomina o horror.
O maior trunfo de "O Diário da Esperança", contudo, está nos atores gêmeos László e András Gyémánt, que emprestam autenticidade à dupla central de personagens, projetam sofrimento e crueldade em iguais medidas e impedem que a história naufrague no sentimentalismo.
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