CRÍTICA
Tema social aproxima filme de Cingapura de nosso cotidiano
A conquista da Caméra d'Or por Anthony Chen, 31, no Festival de Cannes de 2013 não é um daqueles méritos que se apagam com a memória das competições.
O prêmio, concedido a um trabalho de estreante exibido numa das seleções do festival francês, conferiu merecida distinção ao singular trabalho do diretor cingapuriano em "Quando Meus Pais Não Estão em Casa".
Como sugere o título, o filme narra, em parte, as aventuras de um garoto na ausência da família. Mesmo que o endiabrado Jialer lembre muito o Antoine Doinel de "Os Incompreendidos", de Truffaut, e outras crianças do cinema, o longa de Chen não fica só na evocação da infância, tendência de primeiros longas de jovens diretores.
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Cena do filme "Quando Meus Pais Não Estão em Casa" |
Num primeiro momento assistimos aos distúrbios domésticos provocados pela insubordinação do pequeno Jiale, mas logo entra em cena uma personagem que descentraliza a trama e abre perspectivas além do drama infantil.
A chegada de Terry, empregada de origem filipina, explicita outros desarranjos domésticos e expõe temas como a exploração social e os efeitos da crise econômica.
Ambas questões apagam a distância exótica que poderia ter um filme vindo de Cingapura e torna seu relato bem familiar ao nosso cotidiano.
O parentesco com o elogiado "Casa Grande" é evidente e estimula uma comparação do modo como dois jovens diretores solucionam problemas comuns de representar e transmitir mensagens.
A escolha de "Quando Meus Pais Não Estão em Casa" concentra-se menos no discurso sociológico e mais nos afetos.
Uma primeira face do filme aponta a distância dos pais, a ausência deles e o poder repressivo que ambos impõem no trato com o garoto.
A empregada, no entanto, não consegue reproduzir a hierarquia entre adulto e criança nem assume de imediato o papel de mãe substituta. Sua relação com o menino começa com disputas e abusos, um padrão que transpõe a exploração para a escala de um miniditador.
À medida em que o trato entre Terry e Jiale deixa de ser só de subordinação, o filme capta outros efeitos da convivência física entre patrões e empregados nos olhares da mãe, expressão de repelência à intrusa.
Outro tema relevante do filme é a crise financeira. As demissões todos os dias no escritório da mãe e a situação de desemprego do pai ampliam o drama para além da zona doméstica e complementam o registro de desintegração de uma ordem imposta.
Se tudo no filme tem uma aparência micro, banal, o efeito que ele provoca, ao contrário, é amplo e de longa duração. (CÁSSIO STARLING CARLOS)
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