Filme na TV: Semana tem 'Paradise Now' e 'Rota Suicida'
SEGUNDA-FEIRA (18)
Não falta dignidade, e nem mesmo oportunidade a "Era uma Vez em Nova York" (2013, TC Premium, 22h), em que Marion Cottilard faz o papel de Ewa Cybulska.
Junto com a Irmã, Ewa deixou a Polônia, vindo para os EUA. Estamos em 1921, há quase um século. A imigração era algo tão complicado quanto hoje. No caso, os médicos forçam a irmã de Ewa, doente, a permanecer em quarentena.
Ewa entra, disposta a mover céus e terras para se unir à irmã. Isso inclui ser prostituída por Bruno (Joaquin Phoenix) e ajudada com sinceridade por um mágico (Jeremy Renner).
Como seu registro preferido é o dos dramas pessoais, é esse o caminho escolhido por James Gray, diretor do filme. É esse caminho, no entanto, que vai apequenaro filme: por mais que torçamos para que o final feliz toque Ewa e sua irmã, sabemos que em "Era uma Vez..." o problema real, o dos imigrantes, passa sob o seu nariz e mal é notado.
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Os imigrantes Bruno Weiss (Joaquin Phoenix) e Ewa Cybulska (Marion Cotillard) em cena do filme 'Era Uma Vez em Nova York' |
TERÇA-FEIRA (19)
Dois filmes bem opostos: o norte-americano "Beleza Americana" (1999, TC Cult, 19h50) e o brasileiro "O que Se Move" (2013, MaxPrime, 20h15).
O primeiro ganhou todos os Oscars centrais (filme, direção, roteiro, fotografia) e fez bela carreira. O segundo teve uns poucos milhares de espectadores e ganhou um
prêmio (melhor filme no Cineport 2014).
A "Beleza" de Sam Mendes diz respeito à cenografia, ou à hipocrisia _tanto faz: de como a felicidade aparente e impecável esconde o horrível. "O que Se Move" de
Caetano Gotardo diz respeito a como as aparências podem ser julgadas apressadamente. Como, por trás do horrível, pode haver o sensível e o belo.
"Beleza" vai no sentido do "senso comum", enquanto o segundo desafia justamente esse senso comum midiático. O inglês Sam Mendes sumiu após o Oscar para ressurgir com 007 no belo "Skyfall". Gotardo, bom cineasta brasileiro, rema contra a maré.
QUARTA-FEIRA (20)
O tempo levou alguma coisa de "Quando Nem um Amante Resolve" (TC Cult, 17h40). Quando foi lançado, em 1970, era audacioso falar, nos EUA sobretudo, a respeito de uma mulher oprimida pelo marido, provavelmente o advogado mais chato e metido de Nova York.
A senhora Balser segura todas, mas o senhor Balser parece fazer questão de avinagrar as coisas a cada instante. Como resultado, veremos que a moça vai se atirar nos braços de um escritor. Mas será ele uma solução ou um novo problema? E será que ela não procura mesmo é um novo problema?
Se assume a ousadia de questionar a instituição do casamento, por um lado, por outro Frank Perry assume aqui o ponto de vista da mulher _o que é um aspecto bem marcante dos anos 1960/70.
E, quando se pensa em Perry, pode-se falar de um sentido acurado e delicado de observar as personagens. Mas também, e sobretudo, de um cineasta daquele momento.
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Ali Suliman (à frente) como Khaled e Kais Nashef como Said em cena do filme "Paradise Now" |
QUINTA-FEIRA (21)
O que faz a atualidade aparentemente eterna de "Paradise Now" (2005, Arte1, 23h30) é a incapacidade ocidental (Israel aí incluído, claro) de tratar com os palestinos.
Sabemos que o problema já não é mais apenas palestino: espalha-se por todo o Oriente Médio, e mais um pouco. Chama-se Al Qaeda ou Exército Islâmico. Cada vez mais essa parte do mundo se assemelha em certos aspetos a este filme de Hany Abu-Assad.
Aqui, os dois rapazes, Said e Khaled, quando os olhamos, não têm nada de facínoras capazes de tudo em nome da fé. Como vários que o E.I. tem recrutado mundo a fora.
Said e Khaled, porém, dispõem-se a morrer e a matar quem estiver por perto: o terror será seu método. É possível maldizê-los com o estigma da palavra "terrorista". Isso não os mudará, nem aos seus inimigos: o cinema aqui entra como agente de uma tolerância por ora cada vez mais ausente da história.
SEXTA-FEIRA (22)
Antes de tudo mais, "Moscou" (2009, TV Brasil, 0h) nos fala da integridade de Eduardo Coutinho. Após ter chegado a uma espécie de resposta perfeita a suas inquietações a respeito da representação (em "Jogo de Cena", de 2007), era preciso seguir adiante.
E se a vida é uma espécie de jogo de cena, que tal embrenhar-se pelo teatro mesmo, em busca de uma nova questão? Assim, aqui temos uma montagem de "As Três Irmãs", de Tchecov, pelo grupo Balcão.
Não a montagem, mas os ensaios, o processo que leva do texto à cena. Trata-se de um documentário, portanto. Esse documentário versa sobre a ficção, sobre o trabalho da ficção, e deixa-se contaminar por ele.
Esse é seu encanto principal. Seria o único? Pessoalmente, não creio. É preciso convir, no entanto, que estamos aqui num momento de passagem para o que seria "Um Dia na Vida" (2010), outro primor de Coutinho.
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O ator Clint Eastwood e a atriz Sondra Locke em cena do filme "Rota Suicida" |
SÁBADO (23)
Em "Rota Suicida" (1977, TCM, 2h25), Ben Shockley é um profissional. Tira provinciano, é enviado a Las Vegas com a missão de resgatar a única testemunha de que dispõe a Justiça contra um chefe mafioso e levá-la a Phoenix, Arizona.
O trajeto não é tão longo assim, mas com chefe de máfia envolvido presume-se desde logo que a travessia não será tranquila. Tanto mais que a tetemunha, uma garota de programa, não tem a mínima disposição de se pôr em risco junto com ele.
Os profissionais de Clint Eastwood, autor e ator do filme, seguem o modelo clássico. Pode-se lembrar o exemplar jornalista de "Crime Verdadeiro" (1999): só entra em campo quando a matéria é sua, seja lá o assunto que for.
Ok, o Clint de "Crime Verdadeiro" pode ser mais maduro que o de "Rota Suicida". Mas a aventura não é menor. Nem a franqueza.
Ainda hoje, outra aventura: "Ninfomaníaca 2" (2013, TC Cult, 23h55).
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Os atores Katie Holmes e Alexander Skarsgard em cena de "O Doador de Memórias" (2014). |
DOMINGO (24)
O cinema mais recente, em especial o destinado a espectadores jovens (adolescentes, de preferência) tem se especializado em nos trazer mundos perfeitos que, no entanto, mostram-se desastrosamente imperfeitos.
Assim é, entre outros, em "O Doador de Memórias" (2014, TC Premium, 22h). Temos aqui um mundo sem sofrimento, sem opressão. E também sem passado. Uma só pessoa nos liga ao passado, de modo a nos liberar da dor de conhecê-lo.
No caso, temos um jovem que deve ser introduzido à função de doador de memória. Que seja! O filme nos conduzirá, aos poucos, a um mundo em que a opressão é um estado absoluto. Não é de espantar.
O que significa e estamos bem no universo reacionário (mais que conservador) de Philip Noyce dizer ao espectador: não pense com futuros ideais. Não sonhe com utopias. Tudo que você vai encontrar é distopia. Ou, em outras palavras: conforme-se!
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