Em peça, atores discutem relações sobre andaime de quatro metros
É como se víssemos de frente um prédio sem tijolos, e cada cômodo ficasse explicitamente exposto ao olhar externo, mas não a seus moradores, que seguiriam com seu cotidiano moroso.
No espetáculo "Poema Suspenso para Cidade em Queda", que estreia nesta sexta-feira (7) em São Paulo, os atores da Companhia Mungunzá se instalam em nichos de um andaime de quatro metros de altura, como em apartamentos de um edifício.
Em cada uma dessas divisórias se desenrolam histórias individuais. Mas não se trata de monólogos. As tramas se sobrepõem, interferem uma na outra, como vizinhos de um mesmo prédio que se esbarram no corredor ou se encontram no elevador.
São histórias sobre o sentimento de imobilidade, de solidão, de como numa grande cidade existe "tanta gente vivendo junto, mas sem se perceber", explica Luiz Fernando Marques (do Grupo XIX de Teatro), que assina a direção da montagem.
"Propomos uma lente de aumento sobre uma cena cotidiana", conta Marques. "Mas não é voyeurístico. Fazemos uma provocação, e sugerimos um olhar diferente sobre uma cena comum, como um cara assistindo à TV."
Segundo Marques, são cenas que "causam um estranhamento no público". Apesar de serem cotidianas, não escondem seu aspecto teatral: não há compromisso com o realismo, e os atores manipulam eles próprios elementos cênicos, como luz e som –está ali também uma costura de outras linguagens artísticas, com referências ao cinema e às artes plásticas.
"É um reconhecimento, mas ao mesmo tempo uma reflexão sobre o lugar das pessoas dentro de uma cidade."
GABRIELA
A Companhia Mungunzá ganhou projeção em 2011 com o espetáculo "Luis Antonio - Gabriela", vencedor do Prêmio Shell de melhor direção.
Na peça documental, o diretor Nelson Baskerville retratava a história do irmão mais velho, Luis Antonio (1953-2006), homossexual que desafiou as regras de uma família conservadora dos anos 1960 e partiu para a Espanha assumindo a identidade da travesti Gabriela.
Foi durante temporada da peça (que ficou em cartaz até 2013) que a companhia se aproximou de Marques e o convidou para dirigir o novo projeto, o terceiro do grupo.
Dos encontros, surgiram improvisos dos atores e recortes de histórias do próprio elenco, depois finalizadas em texto pela dramaturga e atriz Verônica Gentilin.
A temática pessoal, no entanto, foi só o impulso para retratar relações humanas de forma mais abrangente.
"Mais do que ser uma história documental, existia uma vontade nossa de conversar sobre o nosso tempo", afirma o encenador.
POEMA SUSPENSO PARA CIDADE EM QUEDA
QUANDO qui. a sáb., às 21h, dom., às 19h; até 30/8
ONDE Sesc Santo Amaro - sala multiuso, r. Amador Bueno, 505, tel. (11) 5541-4000
QUANTO R$ 6 a R$ 20
CLASSIFICAÇÃO 16 anos
Livraria da Folha
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