CRÍTICA
Chico César se divide entre o amor e o engajamento em novo CD
O recém-lançado "Estado de Poesia" é o primeiro álbum do paraibano Chico César, 51, depois de sua passagem como gestor em sua terra. Primeiro, como presidente da Fundação Cultural de João Pessoa. Depois, de 2011 a 2014, como secretário estadual de Cultura. E sua música não se afasta da política.
No entanto, a primeira audição do disco passa a impressão de predomínio de canções românticas, alegres. "Muitos desses poemas escrevi para minha namorada, Bárbara", diz Chico à Folha, citando "Caracajus", "Museu" e "Atravessa-me".
As letras são bonitas, oníricas e um tanto "solares". "É um amor Jorge Ben, meio ensolarado, ela vem pela orla, sabe? Uma coisa animada e que tem muito a ver com sonho. Um estado de alucinação que eu acho que o amor dá."
Karime Xavier/Folhapress | ||
Chico César lança novo álbum, 'Estado de Poesia' |
Chico também tem seu momento Adoniran Barbosa em "No Sumaré". Sua intenção foi contar um historinha, como o compositor paulistano fazia. E seu tema são dois mendigos que cuidaram com carinho de uma praça perto da casa do cantor, até que vizinhos os obrigassem a sair.
"Era um casal, um deles travesti. Com a saída deles, o lugar decaiu", ele conta. A música fecha com os versos: "Os noiado fuma crack/onde nós puxava fumo".
Essa música fez na Paraíba, durante a pouco agradável experiência de gestor. "Você tenta fazer as coisas e é barrado por departamentos jurídicos e financeiros." Teve a sensação de que estar lá pouco importava, se sentiu "invisível".
Chico sempre contemplou o canto de protesto. Mas seu engajamento nunca esteve tão explícito como na faixa bônus que encerra o álbum.
"Reis do Agronegócio" dura 11 minutos e traz 96 versos longos de Carlos Rennó, que enviou o poema para Chico com "Estado de Poesia" já pronto. O músico fez a canção como uma balada folk de Bob Dylan. Apesar da insistência de Rennó, disse que não havia mais tempo para colocá-la no álbum.
Em abril, Chico cantou a música sobre um negócio que gasta "um quatrilhão de litros d'água" e "derrama a chuva de veneno na plantação" durante um encontro indígena em Brasília. Os índios pediram que fosse com eles ao Congresso no dia seguinte.
"Os índios me falaram que tudo que eles queriam dizer aos políticos estava na letra, a destruição da natureza, o envenenamento da água e da comida, a ganância dos ruralistas...", diz. Sentiu então que deveria pôr a canção no disco.
"É um tipo de poesia que não podemos nos furtar de exercitar nesse nosso tempo confuso, ou melhor, convulso. Há uma convulsão, né?"
O artista afirma que tem gente nos shows cantando a música de cor, aos brados. "Eu mesmo tenho de ler a letra, mas eles sabem. E aplaudem entre um verso e outro. Parece comício no interior, quando gritam 'muito bem!' a cada frase que o político diz", brinca, rindo muito.
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