TV paga aposta em clássicos de Billy Wilder e Mazzaropi; programe-se
SEGUNDA-FEIRA (21)
O Jardim Europa é um lugar especial. Ali está a mais uniforme concentração de palacetes da cidade de São Paulo e, possivelmente, do Brasil. Mais do que dinheiro, o bairro significa um modo de vida, identidade de valores e comportamento.
Muita gente diz que "Jardim Europa" (2014, Canal Brasil, 19h) é um filme precário. Em vários aspectos é mesmo. Tem, no entanto, a virtude que tantos filmes nada precários são incapazes de ostentar: uma ideia.
Reprodução/Facebook/jardimeuropafilme | ||
Cena do filme "Jardim Europa", de Mauro Baptista Vedia |
Ao se fixar numa família em estado falimentar e em sua recusa de deixar o lugar, Mauro Baptista Vedia, autor do filme, consegue, de maneira inesperada, tocar nesse ponto: o do hábito de ser quem somos, a dificuldade de aceitar mudanças. E até a humilhação do empobrecimento.
Mas é também uma burguesia nascida e crescida sob o signo da preguiça e dos favorecimentos que o filme pretende, sutilmente, nos mostrar. Nada insignificante.
TERÇA-FEIRA (22)
Faria um belo serviço aos espectadores o canal que trouxesse de volta "Perfume de Mulher" (1974), o filme italiano de Dino Risi que está na origem de "Perfume de Mulher" (1992, TC Touch, 17h40).
No primeiro, pontificava Vittorio Gassman. No segundo, Al Pacino. Ambos fazem o papel do cego conduzido por um jovem. Mas são personalidades bem diferentes e às voltas com questões diversas.
No filme de Martin Brest, Pacino faz um cego que só falta ver. Na verdade, seu desespero parece muito mais ligado à experiência nacional americana do que à cegueira propriamente dita.
Divulgação |
Al Pacino em cena do filme "Perfume de Mulher", de Martin Brest |
Este ex-combatente e ex-assessor de Lyndon Johnson parece ser o único que vê um país ser corroído ao abdicar de seus valores na formação dos jovens. Daí o oficial ser o protagonista do filme, mas o pivô é, sem dúvida, seu ajudante (Chris O'Donnell).
Ainda no setor "problemas da América": "Apocalypse Now" (1979, TCM, 18h35).
QUARTA-FEIRA (23)
Roger Corman ficou mais conhecido por proezas como rodar um filme em dois ou três dias do que por seus méritos como diretor, que não são pequenos.
Por vezes, ficam encobertos pela produção não raro deficiente, mesmo nos seus momentos maiores ("O Homem dos Olhos de Raio-X" é um grande filme). Talvez por isso, seu trabalho preferido fosse mesmo "O Massacre de Chicago" (1967, TC Cult, 20h05).
Corman teve um orçamento decente para levar adiante seu relato documental, quase cirúrgico, dos eventos de 14 de fevereiro de 1929. Poucos meses antes da quebra da Bolsa de Nova York, Al Capone (Jason Robards) planeja e executa o massacre, numa garagem, dos membros da gangue de Bugs Moran.
Foi o momento de consolidação do gângster como o grande criminoso de Chicago e o mais célebre de todos do período da dita Lei Seca (a era de proibição das bebidas alcoólicas) nos EUA.
QUINTA-FEIRA (24)
A geração que cresceu nos anos 1980 sabia ter suas revoltas, contradições e angústias, que não raro se resolviam na comédia. Mas também podia ser romântica até a medula e engolir com felicidade "Ghost - Do Outro Lado da Vida" (1990, TCM, 22h).
Certamente Demi Moore ajudou —era uma gracinha e, desprotegida, sem seu Patrick Swayze por perto, mais ainda. Mas aí ela passa a ser acompanhada pelo fantasma do seu amado e o fantástico se consolida. Também ajudou no sucesso do filme o fato de a intermediação entre os dois mundos ser feita por Whoopy Goldberg.
Divulgação | ||
Patrick Swayze e Demi Moore em cena do filme "Ghost: Do Outro Lado da Vida" |
"Splash, uma Sereia em Minha Vida" (1984,TCM, 0h15) não recorre ao além para chegar ao fantástico (tampouco ao melaço). Aqui, o jovem Tom Hanks, desiludido da vida amorosa tem a vida salva pela bela Madison (Daryl Hannah).
E tudo seria uma beleza não fosse ela uma sereia. Mas é justamente esse o fato que animará o filme de Ron Howard.
SEXTA-FEIRA (25)
Muitas vezes se pode questionar os irmãos Coen por se valerem de um certo "comercialismo de qualidade", digamos assim. Ou, em outras palavras: por correrem muito menos riscos do que parecem correr.
Esse não é certamente o caso de "Inside Llewyn Davis: Balada de um Homem Comum" (2013, TC Cult, 12h05). Davis é um jovem compositor na virada dos anos 1960. Ao vê-lo, parece que veremos a história de um Bob Dylan.
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Oscar Isaac em "Inside Llewyn Davis: Balada de um Homem Comum" |
No entanto, seu caminho mostra-se muito mais tortuoso do que poderia o espectador desejar. E os Coen conduzem bem sua trama, ora dando a impressão de que se abre a porta do sucesso para o rapaz, ora fazendo o exato inverso.
É do que existe imponderável, de mero acaso, na vida de um artista inclusive o eventual sucesso ou não que trata o filme. Com dureza e pertinência.
Mais tarde um pouco (16h05), o mesmo canal traz o clássico "Crepúsculo dos Deuses" (1950), de Billy Wilder.
SÁBADO (26)
Pode ser um dia bem brasileiro, já que a TV Brasil volta a exibir Mazzaropi (incrível: seus filmes não param de fazer sucesso), no caso "O Jeca Macumbeiro" (1975, 19h30), um dos trabalhos do comediante em sua última fase.
Já o Futura entra com "Tapete Vermelho" (2005, 22h), simpática comédia sobre um caipira que pretende levar o filho à cidade para assistir a um filme de Mazzaropi, justamente. O percurso o leva à descoberta de que não será mais tão fácil ver o comediante numa tela de cinema.
Já a Cultura investe em "Anuska, Manequim e Mulher" (1968, 0h), estreia de Francisco Ramalho Jr. na direção, a partir de um roteiro de Ignacio de Loyola Brandão.
O setor estrangeiro está defendido por algumas boas reprises, entre as quais destaca-se "O Fugitivo" (1993, TCM, 20h40), o belo "thriller" em que Andrew Davis retoma as aventuras do dr. Richard Kimble, de antiga série de TV.
DOMINGO (27)
Em "O Estranho Caso de Angélica" (2010, TV Brasil, 0h) a vida confronta a morte de maneira de fato estranha: um fotógrafo, designado para documentar o rosto de uma jovem que acaba de morrer descobre que ela, a partir de dado momento, sorri para ele.
Não é apenas a estranheza: o fascínio também entra em questão, transformando a morte em vida. E a imagem, claro. Com isso, Manoel de Oliveira nos desloca, insidiosamente, a outros territórios: o de Georges Méliès, claro, evocado em suas trucagens (portanto estamos no momento de descoberta e máxima potência do cinema).
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Parentes da jovem Angélica lamentam morte em cena de "O Estranho caso de Angélica" |
Mas também, ou sobretudo, o de "Blow Up": o daquilo que resta para sempre misterioso, inapreensível, mesmo no mais objetivo dos registros (o da fotografia, mas também o do cinema).
Se a trucagem faz ver "mais", resta o território indevassável da ambiguidade, da sombra ou do sorriso que toda imagem produz: é este que Oliveira explora como grande mestre.
Livraria da Folha
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