CRÍTICA
Novo 'Asterix' só vai encantar quem já conhece as HQs do herói
Criado em 1959 pelo desenhista Albert Uderzo, 88, e o roteirista René Goscinny (1926-1977), Asterix se tornou um tesouro nacional francês. Depois de 35 álbuns de quadrinhos e adaptações ao cinema, o personagem ganha uma versão em animação 3D que estreia hoje no Brasil, "Asterix e o Domínio dos Deuses", para seduzir seus fãs.
O visual é um pouco diferente da criação da dupla francesa, mas o resultado é bem simpático. Asterix e seus amigos ficaram um tanto fofinhos, rechonchudos até. Devem ser mais atraentes para as crianças menores.
Mesmo após a morte de Goscinny e a aposentadora de Uderzo, em 2010, os quadrinhos prosseguem na França, com outros autores.
Divulgação | ||
Obelix, Asterix, o druida Panoramix e o bardo Chatotorix, personagens da animação |
Como tudo que é produzido até hoje com Asterix, a ordem é respeitar completamente a base das histórias: a resistência de uma aldeia gaulesa contra a ocupação pelo Império Romano.
Como uma pequena aldeia resiste aos soldados de Roma? Ingerindo uma poção mágica que deixa seus moradores fortes e invencíveis.
Depois é só partir para a pancadaria, sob liderança do baixinho intrépido Asterix e seu fiel companheiro, o gigante gordão Obelix, que é forte o tempo todo, sem precisar ingerir a poção –ele caiu num caldeirão da mistura quando era bebê.
O roteiro vem do álbum de HQ de mesmo nome, o 17º do herói, lançado em 1971. Para sufocar a insubordinada aldeia gaulesa, os romanos resolvem construir uma cidade enorme ao redor dela. Esse empreendimento imobiliário é o tal "domínio dos deuses".
A convivência forçada com os romanos é uma situação nova para Asterix e seus amigos, acostumados aos confrontos diretos com as legiões de César. Até os gauleses perceberem que seus novos vizinhos estão cheios de más intenções, vão ter de aturá-los por algum tempo.
Esse período de "política de boa vizinhança" rende as passagens mais engraçadas. Louco para brigar, Obelix desabafa: "Para que servem os romanos se a gente não pode bater neles?".
O lado bom do filme vem, obviamente, do material que o inspira. "Asterix", o quadrinho, figura na história dos gibis como uma das mais felizes reuniões de personagens bacanas e uma das mais agudas utilizações do formato para sátiras devastadoras.
O lado não tão bom do longa também vem das características da HQ. "Asterix" tem no papel um ritmo de narrativa incomum e muito difícil de imitar. Uderzo e Goscinny sabiam como poucos usar a passagem de um quadrinho ao seguinte para imprimir surpresa, para introduzir uma piada visual matadora.
Os autores também dominavam a técnica de repetição, de reproduzir situações para aproveitar o melhor de cada personagem em vários contextos. Outros quadrinistas tentam, mas caem na repetição estéril, sem graça.
Com os franceses era diferente. O leitor sabe, por exemplo, que Obelix vai controlar seu ímpeto brigão até o limite, antes de estourar para cima dos romanos. Era sempre assim nos enredos. Mas Uderzo e Goscinny faziam de cada explosão do gordo um momento épico.
No cinema, nesta e em todas as outras animações já produzidas, esse ritmo se esvai. Na versão com atores –existem quatro filmes com Gérard Depardieu como Obelix–, o resultado é pior ainda. O público acaba rindo mais com a lembrança dos quadrinhos já lidos do que com aquilo mostrado na tela.
Assim, esta animação cai numa armadilha. Realizada com ótima técnica e cheia de boas intenções, acaba sendo atraente para quem é fã dos quadrinhos e vai assistir a tudo como uma celebração a esses personagens queridos.
Será muito difícil alguém que nunca folheou um gibi do herói gaulês se encantar com "Asterix e o Domínio dos Deuses". Para entrar no mundo desses personagens, o melhor caminho está mesmo impresso em papel.
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