crítica
Woody Allen faz seu filme mais complexo e radiante em 10 anos
Exibido nesta quarta-feira (11) na abertura do 69º Festival de Cannes, "Café Society" tem toda cara de testamento fílmico de Woody Allen. Pode não ser o último filme do diretor nova-iorquino. Espera-se que não seja. Mas mereceria ser. Woody não fazia algo tão bom desde, ao menos, "Match Point" (2005).
"Café Society" é uma síntese do melhor de seu cinema, com um vigor há muito distante da obra do diretor.
Há as trapaças da sorte, como em "Match Point". Os dilemas amorosos e a polaridade Nova York vs. Los Angeles, de "Annie Hall" (1977). O fascínio por Nova York, de "Manhattan" (1979).
Também o amor pela Hollywood clássica, de "A Rosa Púrpura do Cairo" (1985). As querelas familiares, de "Hannah e Suas Irmãs" (1986) e "A Era do Rádio" (1987). A lista poderia prosseguir até o final desta resenha.
O enredo parece saído de uma impossível colaboração entre F. Scott Fitzgerald, pelo retrato irônico da elite americana dos anos 1930, e Philip Roth, pela visão crítica às tradições da formação judaica.
Um jovem do Bronx nova-iorquino, Bobby Dorfman (Jesse Eisenberg), decide tentar a sorte em Hollywood, pedindo emprego ao bem-sucedido tio Phil (Steve Carell), agente de estrelas como Irene Dunne e Joel McCrea.
Ao mesmo tempo, o irmão de Bobby, Ben (Corey Stoll), ascende na carreira de gângster até abrir o próprio "night club" em Manhattan.
Decepcionado com a vida hollywoodiana e com o coração partido por Vonnie (Kristen Stewart), Bobby retorna a Nova York e se reinventa como sócio da bem-sucedida boate do irmão.
É como um misto de "Barton Fink" (1991), dos irmãos Coen, "O Último Magnata" (1976), de Elia Kazan, e "Os Bons Companheiros" (1990), de Martin Scorsese, que avança "Café Society", narrado pelo próprio Woody.
Desde as parcerias com o diretor de fotografia Gordon Willis (1931-2014) nos anos 1970, um filme dele não enchia os olhos assim.
Feito que Allen consegue agora graças à tradicional competência cenográfica de Santo Loquasto e à mágica luz alaranjada do diretor de fotografia Vittorio Storaro, emprestada do finado Néstor Almendros (1930-1992).
Muito mais importante do que ser a melhor abertura de Cannes sob a batuta de Thierry Frémaux, diretor-geral do festival, "Café Society" confirma que, ao contrário do que sinalizou em seus últimos filmes, Woody Allen ainda tem lenha para queimar.
Aos 80 anos, assina seu mais complexo e radiante filme na última década. O ano de 2016, afinal de contas, pode não ser tão ruim assim.
Livraria da Folha
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade
- 'Fluxos em Cadeia' analisa funcionamento e cotidiano do sistema penitenciário
- Livro analisa comunicações políticas entre Portugal, Brasil e Angola
- Livro traz mais de cem receitas de saladas que promovem saciedade