crítica
'Manual do Escoteiro' foi sonho de consumo realizado para pré-nerds
Quem era criança no início dos anos 1970 achava que o "Manual do Escoteiro Mirim" era como o Cinto de Utilidades do Batman. Os dois tinham recursos ilimitados para ajudar em hora de apuros e, claro, não passavam de sonhos de consumo que jamais se tornariam objetos reais.
Pois bem. Não é que o livro usado por Huguinho, Zezinho e Luizinho apareceu um belo dia na banca da esquina da minha escola, lá em Santo André, no ABC paulista?
Provocou um rombo na mesada, mas qualquer valor era pouco diante de tanto conhecimento concentrado.
Nos anos seguintes, novos manuais chegaram às bancas, como o do Pateta, falando de esportes, ou o do Professor Pardal, sobre invenções.
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Mas nenhum se equiparou ao original. A grande sacada naquelas páginas foi repetir a variedade de informações que o livro oferecia nos gibis dos sobrinhos do Donald.
Com tanta coisa, de níveis diferentes de utilidade no dia a dia, o "Manual" escapava da possível crítica de que estaria faltando isso ou aquilo.
Como reclamar de um volume que apresentava receitas de sucos, explicava placas de trânsito, mostrava o cardápio dos bichos do zoológico e ensinava a escrever cartas, organizar sua biblioteca em casa e fazer coisas como pipas, cata-vento, apito de papel ou um legítimo colar indígena?
Na época, alunos das séries do antigo Primário (hoje Ensino Fundamental), como este repórter, iam para a escola com mochilas entupidas de livros e cadernos –e o lanche.
O fardo ficou mais pesado, porque os pequenos pré-nerds tinham de levar o "Manual" para todos os lugares. Afinal, a qualquer momento você poderia precisar acender uma fogueira sem usar fósforos ou saber a diferença entre popa, proa, estibordo e bombordo.
A bem-sucedida fórmula do livro foi expandir os conhecimentos tradicionais do escotismo, como acampar e sobreviver no mato, com atividades caseiras lúdicas e informações divertidas, mesmo inúteis.
Talvez a melhor maneira de explicar o que é o "Manual" às novíssimas gerações seja dizer que é "dar num Google" virando folhas de papel.
É difícil prever se o novo "Manual" conseguirá cativar crianças do mundo digital, mas certamente pais e avós vão gostar do relançamento.
Eu fico feliz, mas ainda espero o Cinto de Utilidades.
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