ANÁLISE
'Sex symbol', voz de Cauby Peixoto derretia corações de jovens virgens
Que cantor no Brasil gravou e fez shows por 65 anos ininterruptos, mantendo a voz inabalável? A resposta é uma só: Cauby Peixoto. Cauby foi um dos primeiros a ser lançado por meio de uma ousada estratégia de marketing, em 1953, quando o industrial e dublê de compositor Di Veras o descobriu em São Paulo e disse a ele que, se fossem juntos ao Rio, poderia fazer dele "o maior cantor do Brasil".
Conseguiu. Em cerca de seis meses, ele estourava com a versão de "Blue Gardenia", sucesso de Nat King Cole, uma de suas maiores influências ao lado de Orlando Silva.
Passou a ser o cantor mais polêmico e ouvido de seu tempo, além de "sex symbol" absoluto, com uma voz ideal para derreter corações de jovens virgens, ávidas por romances vistos no cinema.
Munido de charme híbrido e modos delicados, aquele moreno de nome indígena, mas com glamour hollywoodiano, acabava mesmo massacrado por elas, "suas queridas fãs".
Após uma temporada nos EUA, onde aprendeu muito sobre showbusiness, surpreendeu nos anos 1960 ao gravar bossa nova e a MPB egressa dos grandes festivais.
Ainda mostrou versatilidade em outros idiomas. Fez sucesso na Espanha e em Portugal, e, entre 1964 e 1968, abriu uma boate, a Drink, no Leme.
Na década seguinte, amargou um injusto ostracismo, sem jamais deixar de emendar uma temporada atrás da outra em todos os inferninhos e churrascarias disponíveis no país. Finalmente, em 1980, com o LP "Cauby! Cauby!", remodelou seu repertório e a interpretação, fazendo com que a crítica também se rendesse aos seus encantos.
Todos os seus trabalhos passaram a ser alardeados pela grande imprensa e, ao contrário de seus contemporâneos, tirou sempre um coelho da cartola, recriando canções da moda a seu jeito nos shows.
Nos discos, num invulgar ecletismo, foi de Baden Powell a Beatles, de Sinatra a um songbook de sambas, de serestas a Roberto Carlos.
O Cauby que conheci era muito perspicaz, inteligente e tinha uma cabeça extremamente aberta, nada careta.
Sabia perfeitamente a diferença entre "brega" e "chique", o que falar à imprensa para gerar bochicho, inclusive achava interessante manter o mistério sobre sua sexualidade, já que, pessoalmente, jamais teve qualquer complexo em relação a isso.
Era divertido com amigos e também exigentíssimo com seu canto, aceitando diversas sugestões de vários produtores tanto no modo de interpretar quanto no repertório.
Cauby chegou intacto até os dias de hoje não apenas por ter conservado o vozeirão, mas por ter conseguido unir uma imagem pop e extravagante a um profundo respeito à própria música: à melodia, à divisão rítmica e ao poder na emissão de sua voz.
Ademais, um artista de recordes, surpreendente em todas as fases. Daí, o mito.
RODRIGO FAOUR é jornalista e autor de "Bastidores - Cauby Peixoto: 50 Anos da Voz e do Mito" (ed. Record)
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