Análise
Sonia Rykiel pôs fim à submissão feminina
Muito se fala sobre a libertação das mulheres do corselet, feito creditado a Coco Chanel (1983-1971), e do empoderamento feminino propiciado pelas roupas de Yves Saint Laurent (1936-2008). Mas há pouca memória sobre a revolução de mercado, técnica e, principalmente, autoaceitação promovida pela estilista francesa Sonia Rykiel, morta na quinta (25), em Paris.
Se até o final dos anos 1960 a moda mundial dependia das criações saídas dos ateliês de costura para definir o que seria tendência, foi a partir da ascensão da Rive Gauche, zona de Paris frequentada por artistas e modernos da época, que o chamado "estilo pessoal" passou a ser mais importante do que uma assinatura.
Jacques Demarthon/AFP | ||
Peça-chave da libertação dos costumes em 1970, estilista morreu ontem, aos 86 |
Rykiel talvez tenha sido a maior entusiasta do fim da submissão das mulheres à moda. Ex-vitrinista, sabia que o encantamento está na soma de bom caimento e leveza estética. Chegou nele com um simples suéter de tricô que mandou fazer na Itália e, logo depois, foi adotado por atrizes do calibre de Catherine Deneuve, Brigitte Bardot e Audrey Hepburn (1929-1933), uma das clientes mais assíduas de suas peças coloridas.
O pequeno tecido justo foi taxado pela indústria de "poor boy" (menino pobre), alcunha que evidenciava uma espécie de recalque de quem acreditava que a peça não passava de um mero pedaço de pano.
Com o passar dos anos, a crítica engoliu com entusiasmo o "menino pobre" –que, haja vista os quatro dígitos impressos na etiqueta, de pobre não tinha nada– e deu à sua criadora o título de "rainha do tricô".
As criações da estilista deram uma conotação de nobreza a tecidos e modelagens simples, aos quais Sonia aplicou estampas, pregou fitas e aplicações até o mal de Parkinson comprometer de vez seus movimentos, em 2007.
No mesmo ano, passou o comando criativo de sua grife à filha, Nathalie. Em 2012, revelou a condição que enfrentava desde 1996 no livro "N'oubliez Pas que Je Joue" (em tradução livre, "não esqueça que estou no jogo"), sucesso daquele ano na França.
Rykiel escondeu por 15 anos a doença que a matou da mesma forma com que levou a vida: nas sombras.
Seu nome, um dos mais relevantes das últimas temporadas de desfiles em Paris, não gerava tantos "likes" quanto as apresentações megalomaníacas de grifes famosas –mais pela logo do que pelo legado. Mas era o gosto pelo "menor", pela limpeza que definiu sua moda, o tempero da chamada "elegância parisiense". E saiu assim, à francesa.
Livraria da Folha
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade
- 'Fluxos em Cadeia' analisa funcionamento e cotidiano do sistema penitenciário
- Livro analisa comunicações políticas entre Portugal, Brasil e Angola
- Livro traz mais de cem receitas de saladas que promovem saciedade