Filme francês usa cena melancólica e cômica para abordar crise dos 50 anos
Pouco conhecido no Brasil, o ator, roteirista e diretor Bruno Podalydès interpreta pela primeira vez, neste que é seu sétimo longa, o papel central. Suas comédias têm uma dimensão autoral, e esta se equilibra no paradoxo de uma viagem quase imóvel como antídoto à crise de um personagem cinquentão.
Apaixonado por aviões, principalmente pelos modelos usados por Saint-Exupéry e outros heroicos pioneiros, Michel (Bruno Podalydès) se entedia em seu emprego de designer gráfico. Um dia ele vê fotos de um caiaque –cujas linhas fluidas evocam a fuselagem de um avião– e se apaixona imediatamente.
Completo ignorante sobre o assunto, compra um caiaque em kit, que aprende a montar –não sem cômicas dificuldades–, e todos os equipamentos necessários (e desnecessários) para se lançar numa aventura solitária: descer o rio até o mar. A preparação é repleta de percalços, descritos com um humor que reitera o lado mais lunático da personalidade de Michel.
Incentivado pela mulher, a indulgente Rachelle (Sandrine Kiberlain), ele se lança à bucólica odisseia, que se pretende introspectiva, rompendo com seu cotidiano insosso.
A tensão e a angústia que carrega começam a se dissipar quando ele amarra seu caiaque nos fundos de um bar, povoado por uma fauna humana variada e divertida, procurando um lugar para armar sua barraca e passar a noite.
A partir daí o filme ganha uma dimensão mais ampla e aprofunda o lado hedonista de Michel, que se deixa levar, embora o ar perdido nunca o deixe por completo. Ele logo simpatiza com a dona do bar e uma garçonete –que choram amores perdidos– e dois malucos que bebem absinto e constroem algo misterioso.
Capturado pela atmosfera vaudevilesca e pelo charme das duas mulheres, Michel prolonga sua estadia. E, a cada vez que resolve seguir viagem, algo acontece e ele volta ao bar, que aos poucos se afirma como um paraíso libertário e libertino, microcosmo onde reina o descompromisso. O périplo, que avançava lentamente, estanca de vez: o caminho é mais importante que o destino, o processo prima sobre o resultado.
Uma das referências de Podalydès é o também francês Jacques Tati, nas gags sobre os gadgets do camping e a parafernália ao redor do caiaque. Mas a referência maior é sem dúvida Nanni Moretti, outro cineasta que interpreta personagens melancólicos, solitários e um tanto deslocados que vivem histórias de ressonâncias existenciais.
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