Gero Camilo une universos do samba e do golpe de 64 na peça 'Razão Social'
Um misto de "desabafo e vontade de celebrar a vida" levou Gero Camilo e Victor Mendes a alinhavar com samba um tenso momento político da história brasileira.
Em "Razão Social", espetáculo que estreia nesta sexta (18) em São Paulo, a dupla retrata dois personagens na noite do golpe militar de 1964.
Fugindo do incêndio que atingiu a sede da UNE (União Nacional dos Estudantes) no Rio, o operário Sabino (Camilo) e o estudante Juscelino (Mendes) escondem-se no Zicartola, bar aberto por Cartola e sua mulher, Dona Zica.
O local, no centro da cidade, funcionou apenas por dois anos (de setembro de 1963 a maio de 1965), mas marcou o encontro entre a classe média da zona sul carioca e o samba do morro. Ainda foi ponto de encontro entre intelectuais contrários ao regime militar.
Foi essa função do Zicartola que deu título ao espetáculo, uma brincadeira com o nome de registro do bar, Razão Social: Refeição Caseira Ltda.
É ali que se encontram os mundos distintos da peça: o estudante engajado e o operário –em princípio alienado politicamente, depois, se alinha aos ideais de Juscelino.
Ficam no Zicartola sem que sejam percebidos. Tampouco interagem com as figuras que passam por ali: Dona Zica (Fabiana Cozza), Cartola (Adolfo Moura) e outras personalidades, como Carlos Cachaça, e Nara Leão, que por vezes surgem como fantasmas ou mesmo sonhos da dupla.
Permeiam a narrativa duas dezenas de sambas, como "O Sol Nascerá", do próprio Cartola, e uma composição original de Mendes e Camilo, "Lágrimas Quentes", de tom político. Todas tocadas em cena pelo elenco e outros três músicos –Everson Pessoa, Gerson da Banda e Nino Miau.
AQUI E AGORA
A dupla, que escreveu e dirige a peça, começou a trabalhar no projeto depois de Mendes ler "Desde que o Samba é Samba", livro de Paulo Lins, há pouco mais de um ano.
"À época, meu único medo era que a história parecesse muito datada. Mas, quanto mais a gente pesquisava a situação política, mais a gente se assustava com a realidade", comenta Camilo sobre os recentes fatos políticos e a ação por vezes violenta da polícia em manifestações de rua.
"Estamos falando exatamente do que está acontecendo hoje", continua Mendes.
O cenário da peça, que remete ao Zicartola, também funciona como uma estrutura fechada, uma espécie de caixa de pandora, explica Camilo. "É a ideia de que você abre e sai um monte de desgraças. Mas ainda fica a esperança."
RAZÃO SOCIAL
QUANDO sex. e sáb., às 21h; dom., às 18h; até 18/12
ONDE Sesc Bom Retiro, al. Nothmann, 185, tel. (11) 3332-3600
QUANTO R$ 9 a R$ 30
CLASSIFICAÇÃO 14 anos
Livraria da Folha
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