'A Trama' retrata a desesperança em vertigem de sentimentos
Jérôme Prebois/Divulgação | ||
Antoine (Mathieu Lucci) e Olivia (Marina Foïs) em cena de 'A Trama', de Laurent Cantet |
A TRAMA (BOM)
DIREÇÃO Laurent Cantet
ELENCO Marina Foïs, Matthieu Lucci
PRODUÇÃO França, 2017, 14 anos
QUANDO estreia nesta quinta (16)
Veja salas e horários de exibição.
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"Recursos Humanos" (1999) e "A Agenda" (2001) fizeram do diretor e roteirista Laurent Cantet um cronista perspicaz da sociedade do trabalho e das reformas que impactaram a França na virada de século.
Na trama de "Entre os Muros da Escola" (2008), Palma de Ouro de melhor filme em Cannes, um novo olhar sobre o mesmo tema –o que vemos ali, em suma, é o trabalho nada romântico de professores– juntou-se a uma tentativa de se aproximar de jovens franceses e suas perspectivas.
Muito do que os personagens diziam ali veio a ser ilustrado por eventos posteriores da vida real, alguns dos quais reverberam em "A Trama" (2017), que leva Cantet e seu corroteirista Robin Campillo (diretor de "120 Batimentos por Minuto") a nova expedição pelo mesmo território.
Paris sai de cena, substituída pela pequena La Ciotat, na costa do Mediterrâneo. O estaleiro que produzia navios petroleiros está fechado há anos e tornou-se "um cemitério", como diz um personagem. O "passado comunista" da cidade é lembrado apenas por antigos trabalhadores.
Traços dessa memória vão surgindo à medida que um grupo de jovens reunido para uma oficina literária (o título original é "L'Atelier", e em inglês foi batizado "The Workshop") fala de lembranças que seus familiares lhes contam.
A atividade é coordenada por uma escritora de romances policiais, Olivia (Marina Foïs, de "Relacionamento à Francesa" e "Irrepreensível") cujo objetivo é levar o grupo, etnicamente variado, a publicar um livro de ficção que use pesquisas sobre a cidade.
Ficamos bem perto de um dos integrantes da oficina, Antoine (interpretado pelo estreante Matthieu Lucci), e somos abastecidos por dados do seu cotidiano que o conectam a sintomas de um certo mal-estar na França do século 21.
Se "Entre os Muros da Escola" funcionava como um coral em que se misturavam as vozes dos alunos de um professor de francês (François Bégaudeau, autor do romance em que o filme foi inspirado), "A Trama" opta por concentrar atenções na relação que se desenvolve entre Olivia e Antoine, o jovem com uma dor que não quer calar.
Perde-se um pouco da floresta com esse procedimento, mas ilumina-se melhor a árvore que Cantet e Campillo decidiram cultivar, e que deixa o espectador em um desconforto crescente. Nada, nada, de repente estamos em uma vertigem de sentimentos.
Ao resvalar no noticiário (nacionalismo de extrema direita, atentados em nome do fundamentalismo religioso), os diálogos fincam "A Trama" em registro muito parecido ao de "Recursos Humanos": aborda-se o macrocosmo sociopolítico sem que tenha a ambição de explicar todo o comportamento dos personagens.
Ao contrário: a zona cinzenta em que se move Antoine incomoda os colegas de curso sem os motivar a investigá-la, mas convida Olivia (e, com ele, o público) a entrar mesmo sabendo que talvez se incomode com o que encontrará.
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