Análise: Dois gigantes da publicidade buscam fusão para combater Google
Por anos, o setor de publicidade era animado pelas mitologia da avenida Madison quanto a pequenas agências independentes mas capazes de criar um bordão ou comercial de TV que se torna parte da cultura cotidiana dos Estados Unidos.
O anúncio, no domingo, da fusão entre dois gigantes do setor, os grupos Omnicom e Publicis, criando a maior companhia de publicidade do planeta, sinaliza que agora a publicidade também está firmemente operando no mundo do Big Data: recolhendo e vendendo informações pessoais sobre milhões de consumidores.
É um ramo competitivo, com empresas de tecnologia como o Google e Facebook usando seus imensos repositórios de dados para colocar anúncios. Entre elas, Omnicom e Publicis responderam por US$ 22,7 bilhões em faturamento no ano passado, superando a rival mais próxima, a WPP. Mas nenhuma companhia de publicidade se aproxima do faturamento de mais de US$ 50 bilhões conquistado pelo Google no ano passado, basicamente pela força de suas operações de publicidade.
Em uma entrevista coletiva em Paris para anunciar a fusão, Maurice Lévy,. presidente-executivo da Publicis, disse que os "bilhões de pessoas" que usam a Internet e fornecem dados a companhias hoje oferecem uma oportunidade de utilizar tecnologias publicitárias a fim de computar bilhões de conjuntos de dados "a fim de desenvolver mensagens relevantes para as mais estreitas audiências".
O negócio da publicidade e marketing está sendo transformado pela tecnologia, porque as agências de publicidade agora recolhem dados e direcionam anúncios a consumidores individuais. A televisão continua a ser a maior beneficiária do investimento publicitário nos Estados Unidos, com um total de US$ 66,35 bilhões em 2013, de acordo com estimativas da eMarketer. Mas a publicidade online (US$ 42 bilhões) em 2013, o que inclui um quinhão de US$ 7,7 bilhões para a publicidade em aparelhos móveis, está crescendo em ritmo muito mais acelerado.
Embora as agências de publicidade trabalhem de mãos dadas com o Google, Facebook e Twitter, essas mesmas companhias também podem trabalhar diretamente com empresas como a General Motors e a Coca-Cola, o que inclui compartilhar dados. As agências de publicidade tradicional --intermediárias entre os anunciantes e plataformas como as redes de televisão, estações de rádio e operadores de sites-- estão sob pressão para oferecer mais valor aos seus clientes, ou terminarão excluídas da equação.
"No setor, estamos vendo mais e mais marcas tomarem parte do dinheiro que costumavam pagar a uma agência e realizando campanhas internamente, ou com outras companhias", disse Brad Rencher, vice-presidente sênior e gerente geral de marketing digital da Adobe Systems.
David Kenny, antigo executivo da Publicis que agora comanda a Weather Company, que opera o canal Weather Channel de TV a cabo e o site weather.com., disse que plataformas como a dele agora trabalham diretamente com anunciantes a fim de desenvolver campanhas publicitárias, especialmente para os aparelhos móveis, sem recorrer a agências de publicidade.
Ao mesmo tempo, emergiram novos concorrentes no espaço da publicidade digital, nos últimos anos, entre os quais a Accenture, Sapiente e Deloitte, consultorias que desenvolveram divisões de marketing e dados para incluir muitos serviços antes oferecidos exclusivamente por agências de publicidade.
"Estamos presenciando uma perda de distinção entre as diversas funções e os diversos participantes", disse Lévy em entrevista depois do anúncio da fusão, domingo. "Neste mundo, é preciso formar parcerias, e é preciso concorrer com grande número de participantes".
John Wren, presidente-executivo da Omnicom, que participou da entrevista com Lévy, disse que "nosso setor não está limitado a um punhado e pessoas. A cada dia há novos concorrentes atravessando as fronteiras do que costumava ser a publicidade tradicional".
Darren Herman, vice-presidente de mídia digital na Media Kitchen, uma agência do grupo MDC Partners, uma holding publicitária de menor porte em Nova York, disse que a fusão não era reação à concorrência dentro do setor publicitário, mas sim uma jogada para fortificar as companhias contra rivais como a IBM, Salesforce, Adobe e Oracle. "Esse combate pode se provar uma batalha perdida", escreveu Herman em mensagem de e-mail.
Para os consumidores, a fusão é mais um sinal de que o negócio do marketing está se tornando mais personalizado, muitas vezes tomando por base informações que os consumidores nem mesmo sabiam estar revelando, entre as quais seus hábitos de consumo da Web, atividades nas mídias sociais e históricos de cartão de crédito. À medida que anunciantes recolherem e combinarem mais e mais desses dados, os consumidores podem esperar o surgimento de publicidade dirigida especificamente a eles.
Em entrevista concedida em junho, Scott Hagerdorn, presidente-executivo da Annalect, uma companhia de marketing de dados que é parte do Omnicom Media Group, declarou que os anunciantes agora podem determinar, em milésimos de segundo, se uma pessoa que está buscando dados sobre um carro de luxo é compradora de carros de luxo ou compradora de carros usados; com base nessa informação, um anunciante pode determinar se vale a pena ou não exibir um anúncio, por exemplo.
"As nuanças são mais pronunciadas", disse Hagerdorn.
As agências de publicidade já recolhem esses dados por meio de diversas fontes, entre as quais os chamados cookies, que acompanham o comportamento dos usuários online. Também recorrem a parcerias com companhias de dados como a Axciom, que recolhem e combinam informações sobre, por exemplo, os sites que uma pessoa visita e as combinam a outras correntes de dados, que incluem o uso de cartões de fidelidade de empresas de varejo.
"Nós realizamos muito na expansão do uso de sistemas de análises de dados", disse Wren, da Omnicom. "Coletar dados para um sistema Big Data e poder transformá-los em percepções sobre o consumidor era a ambição das duas companhias, e será a ambição da empresa unificada".
Mas o mundo dos dados vive uma explosão. Google, Twitter e Facebook rastreiam sentimentos individuais, online. Os celulares inteligentes, carros conectados à Internet, aparelhos para acompanhamento de exercícios, câmeras e até termostatos cada vez mais oferecem informações em tempo real sobre ampla gama de gostos e comportamentos.
Companhias como a IBM, Oracle e Microsoft, acompanhadas por muitas empresas iniciantes no ramo de análise de Big Data, nos últimos passos vêm investindo pesadamente em tecnologia e talentos a fim de atender companhias diretamente, colocando de lado as agências de publicidade e as consultorias.
"Logo haverá bilhões de pessoas em todo o mundo carregando smartphones, e elas todas terão acesso a novas formas de educação, entretenimento e publicidade", disse Marc Benioff, fundador e presidente-executivo da Salesforce.com, uma grande companhia de software que nos últimos anos investiu cerca de US$ 7 bilhões na aquisição de negócios relacionados à publicidade.
"As empresas estão se preparando para manter relacionamento direto com 100 milhões, talvez até um bilhão, de pessoas por vez. Publicis, Omnicom e WPP estão todas criando departamentos de software de marketing, mas a realidade é a Coca-Cola tem um departamento de software de marketing. Como a Burberry, e a Nike, e praticamente todas as companhias com as quais lidamos. Todas estão se tornando mais e mais competentes no uso de dados", ele diz.
Claudio Aspesi, analista da Sanford C. Bernstein, disse que a fusão publicitária do domingo não era simplesmente uma questão de sinergia entre grande empresas, mas sim de ganhar força diante de uma concorrência difícil.
"Se a Omnicom e a Publicis concordam em que o futuro requererá mais investimento em software e em negócios que requerem escala, isso explica a transação", disse. "De repente, o novo conjunto de companhias em ação nesse espaço se tornou não só grande e lucrativo mas está concorrendo com empresas grandes e lucrativas".
Mas David Droga, fundador e presidente de criação da Droga5, uma agência de publicidade de Nova York, expressou mais ceticismo sobre a capacidade da tecnologia para conduzir o negócio sozinha, se o aspecto de criação for perdido.
"A tecnologia potencia tudo, e representa uma grande tela, mas ainda precisamos dos pensadores, dos narradores", disse. "A tecnologia também pode se tornar genérica".
TRADUÇÃO DE PAULO MIGLIACCI
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