Esquema chinês dribla taxa antidumping aplicada pelo Brasil
No início do mês, empresários do setor de cerâmica receberam um email de uma empresa chinesa oferecendo seus serviços para falsificar documentos e burlar as sobretaxas antidumping aplicadas pelo Brasil para importar porcelanato, tipo de ladrilho de alto valor agregado usado na construção civil.
A Folha teve acesso ao email e conversou com um representante da empresa XFA Group Forwarding, sediada em Shenzhen, que confirmou o esquema. A reportagem informou o governo, que vai investigar o caso.
"Já há indícios suficientes para apurar. Vamos chamar o setor para fazer uma avaliação técnica", afirmou Daniel Godinho, secretário de Comércio Exterior.
A operação funciona assim: o porcelanato chinês é embarcado para a Malásia, troca de contêiner na área de livre comércio ou num armazém já dentro do país, e segue para o Brasil.
Os chineses garantem todos os documentos falsos necessários, como declarações de origem e nota fiscal de uma empresa da Malásia.
Dessa forma, os produtos chegam ao Brasil como se fossem fabricados na Malásia e se livram da sobretaxa aplicada contra o produto chinês. A fraude é evidente porque na Malásia não há fabricantes de porcelanato.
Como as tarifas antidumping foram aplicadas há pouco mais de um mês e as importações são planejadas antecipadamente, ainda não há registro de queda de compras da China nem de aumento de embarques para a Malásia.
"Estamos monitorando as estatísticas", diz Antônio Carlos Kieling, presidente da Anfacer, que reúne fabricantes como Portobello e Eliane. "Eles foram muito rápidos, porque os emails começaram a chegar uma semana após a aplicação das sobretaxas."
As tarifas antidumping contra o porcelanato chinês foram aplicadas provisoriamente pelo Brasil no início de julho, após meses de investigação e queda de braço entre fabricantes e varejistas.
A investigação concluiu que os exportadores chineses praticavam dumping e chegavam a vender por US$ 5,87 o metro quadrado um produto cujo preço normal de mercado era US$ 21,37.
Para proteger os fabricantes locais, o governo passou a cobrar sobretaxa de US$ 3,01 a US$ 5,83 por metro quadrado do produto, dependendo da empresa exportadora.
"SOLUÇÃO DE COMÉRCIO"
No email, o grupo chinês qualifica seu serviço como "solução de comércio" e garante que "o custo será muito favorável, porque vai economizar muito em taxa antidumping". A empresa também informa que "tem muitos casos de sucesso no Brasil para esses e outros itens".
"Não é contra a lei, porque todos os documentos são malasianos", disse, por telefone, Simon Lee, funcionário da XFA Group, ao ser questionado pela reportagem se estava ciente que o procedimento é considerado ilegal pela legislação brasileira.
Segundo Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior e sócio da Barral MJorge, as fraudes têm ocorrido em outros casos de dumping de comércio exterior, com desvio de produtos chineses sobretudo para Malásia e Taiwan. "É necessário uma atuação rápida do governo quando se verifica o problema."
O governo informa que poderá tomar várias medidas dependendo da evolução do caso: de uma investigação de falsa declaração de origem a aplicação de multas e ao cancelamento de registro pela Receita Federal.
Se algum importador brasileiro for identificado cometendo fraudes, o caso pode ser levado à Polícia Federal.
OUTROS CASOS
Não é a primeira vez que o governo se depara com esse tipo de fraude. Até agora, já foram investigadas 29 empresas exportadoras que estavam enviando produtos chineses para o Brasil de forma fraudulenta.
Entre os produtos identificados, estão lápis de madeira, malhas de viscose, calçados e outros. Esses itens, sujeitos a tarifas antidumping, chegavam ao país como se tivessem sido fabricados na Malásia, em Taiwan, na Coreia do Sul e até no Japão para não pagarem sobretaxa.
"O importante é que hoje nós já temos todos os mecanismos e as regras para lidar com esse tipo de fraude", afirma Godinho.
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