Na China, carros sem motorista despertam grande interesse
Gansha Wu era gerente de engenharia veterano da Intel Corp. e diretor da Intel Labs China, quando dois acontecimentos viraram seu mundo de ponta à cabeça no ano passado.
Primeiro, ele ouviu o conhecido escritor de tecnologia Michael Malone dizer a uma plateia de funcionários da Intel que, se fossem muito cautelosos, eles iriam fracassar. Depois, participou de uma sessão de treinamento de liderança para executivos da Intel. O treinador lhes disse que "ser um líder é projetar um futuro que é imprevisível e no qual ninguém aposta".
Ele não conseguia dormir à noite, pensando em sua carreira cuidadosamente organizada de 16 anos na Intel. Então, decidiu arriscar. Com quatro colegas, decidiu pelo caminho incerto, que hoje está se tornando mais comum na China do que até mesmo no Vale do Silício: deixou seu emprego para montar uma start-up especializada em carros autônomos.
Nesse processo, Wu se deparou com um momento raro, no qual um setor de tecnologia na China está se desenvolvendo no mesmo ritmo que um mercado semelhante, mas diferente, nos Estados Unidos.
Na verdade, alguns dizem que as condições na China são realmente mais favoráveis à adoção rápida de carros sem motorista, em parte por causa do apoio mais agressivo do governo nacional e dos governos locais. E, ao contrário dos Estados Unidos, a China nunca teve uma história de amor com rodovias e carros.
A posse de automóveis disparou na China, é claro. E, nos últimos anos, ter um carro tornou-se um símbolo de status da classe média. Para os ultrarricos, existem clubes dedicados a Ferraris e Maseratis.
Mas enormes engarrafamentos nas maiores cidades da China podem tornar a experiência de dirigir desagradável. Por que não deixar uma máquina com inteligência artificial fazer o trabalho por você?
Uma pesquisa feita pelo Boston Consulting Group indica que, em 15 anos, a China será o maior mercado de veículos autônomos, disse Xavier Mosquet, um dos diretores gerais da empresa. Os táxis autônomos provavelmente vão liderar a tendência.
"Não é que em Pequim ou Xangai as pessoas estejam mais dispostas a usar os carros, é que o valor econômico é muito maior na China do que nos EUA", disse Mosquet. Ele acrescentou ainda que a poluição do ar poderia ser um catalisador, assim como o trânsito ruim.
Ao mesmo tempo em que empresas americanas como Google e Tesla trabalham em veículos autônomos, várias companhias chinesas também estão trabalhando na tecnologia de carros sem motorista.
A empresa de Internet Leshi Internet Information & Technology (mais conhecida como Letv) tem uma unidade de tecnologia de carros sem motorista, e a montadora chinesa Great Wall Motors abriu um centro de pesquisa no Vale do Silício. A empresa de serviços de buscas na web Baidu é considerada líder na área na China e trabalha em veículos autônomos desde 2013.
Diante da enxurrada de startups, no entanto, Wu e seus colegas são incomuns por causa da experiência que têm.
A empresa de Wu, Uisee Technology, ainda não anunciou seus investidores, mas tem ambições significativas. A equipe pretende ter uma demonstração da tecnologia pronta em menos de um ano no Consumer Electronics Show, em Las Vegas, em 2017.
"A equipe dele é uma coleção rara de super talentos", disse Kai-Fu Lee, investidor de risco de Taiwan e ex-diretor do Google na China. "Eles combinam um especialista em mecânica de uma universidade, um super especialista em visão computacional e o aprendizado de máquina do Google, bem como Gansha e sua equipe de especialistas em semicondutores. Gansha é um excelente líder que junta essas pessoas."
Os fundadores da Uisee dizem acreditar que a empresa vai encontrar um nicho rentável entre os polos do debate sobre carros sem motorista que está fervendo no Vale do Silício.
Elon Musk, presidente-executivo da Tesla, previu que os carros completamente autônomos podem estar nas ruas nos Estados Unidos em um período de dois a quatro anos. Chris Urmson, diretor do programa de carros autônomos do Google, disse que seu objetivo é trazer um carro sem motorista ao mercado em 2019.
Outros são mais cautelosos e dizem acreditar que pode levar uma década ou mais para carros autônomos chegarem ao mercado. E entre os maiores fabricantes de automóveis como a Toyota, o interesse é menor em carros que dirigem sozinhos do que naqueles que têm habilidades de inteligência artificial para ajudar os motoristas, como a frenagem de emergência.
"Vemos algumas etapas em direção à condução totalmente autônoma", disse Wu, acrescentando que tecnologias de segurança estão chegando rapidamente. Ele disse que os sistemas de assistência ao motorista serão seguidos por carros completamente autônomos em circunstâncias restritas, como estradas privadas, rotas fixas em baixa velocidade e ambientes controlados. A Uisee começará pelo desenvolvimento de tecnologias que auxiliam - e não substituem - os motoristas.
O Baidu fez uma parceria com a BMW e recentemente disse que estava testando sua tecnologia nos Estados Unidos. Afirmou que está se preparando para apresentar serviços autônomos de transporte público na China nos próximos dois anos.
Ao contrário do Google, que tem tido dificuldade em convencer os reguladores em seu estado natal, a Califórnia, de que carros que dirigem sem motorista estão prontos para ganhar as ruas, o Baidu tem o apoio dos reguladores e da infraestrutura de uma série de governos locais chineses, o que a empresa vai usar para introduzir pequenos ônibus autônomos que vão executar rotas específicas.
O governo chinês está desempenhando um papel importante no mercado global de veículos sem motorista. Junto com a autorização para o Baidu gerir o transporte público, em outros casos, os governos centrais e locais têm investido em pesquisa e desenvolvimento para projetos de automóveis sem motorista.
Wu também faz parte de um movimento empreendedor crescente na China.
O governo chinês informou que 4,8 milhões novas empresas foram registradas entre março de 2014 e maio de 2015, uma taxa de 10.600 novos negócios por dia, ou sete a cada minuto. Apesar de o investimento de risco ter começado a desaparecer na China recentemente, o país tem claramente sido contaminada com uma atitude ao estilo do Vale do Silício.
Embora em alguns setores ainda seja conhecida como a terra da tecnologia da cópia, a China há muito tempo já passou a copiar o "ethos" das startups do Vale do Silício, com cada vez mais gente empreendendo.
O governo chinês está incentivando o boom como uma forma de resolver uma série de problemas econômicos, incluindo o desemprego e a transição de uma economia centrada na manufatura para uma economia baseada em serviços.
"Este ano, mais de 7 milhões de pessoas estão entrando no mercado de trabalho na China", disse Haiyang Li, professor na Jesse H. Jones Graduate School of Business na Rice University em Houston "O que eles vão fazer com esses alunos? O governo não tem nenhuma maneira melhor de resolver a questão do emprego."
Se, por um lado, os analistas e investidores temem que o governo esteja investindo demais em startups, o apoio do Estado, juntamente com o talento para engenharia na China e com a demanda por empresas de carros autônomos, poderia ajudar a indústria nascente na China.
Mas há obstáculos. Na China, as estradas muitas vezes têm pistas mal marcadas e pouca sinalização. Pessoas, animais, "rickshaws"[triciclos que levam passageiros] e caminhões podem virar na frente de um carro a qualquer momento. Isso contribui para um problema de engenharia ainda mais desafiador na China, disse Junyi Zhang, sócio da consultoria Roland Berger.
"É mais difícil na China, onde muitas estradas têm pedestres, bicicletas, veículos de baixa e de alta velocidade, tudo misturado", disse. "É um ambiente muito complicado, e muitos não andam ou dirigem na mesma forma."
Tradução de MARIA PAULA AUTRAN
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