Dallas homenageará Kennedy enquanto luta contra estigma de "cidade do ódio"
Ruth Altshuler, 89, e Linda Custard, 74, lideram o comitê que organiza a homenagem ao presidente John F. Kennedy no 50º aniversário de seu assassinato, que será lembrado nesta sexta-feira (22). O objetivo delas é claro: acabar com o estigma de "cidade do ódio" que acompanhou Dallas durante anos.
A escolha do prefeito da cidade, Mike Rawlings, foi premeditada: ambas sempre viveram em Dallas e conseguiram mobilizar milhares de cidadãos; são veteranas da filantropia, indispensável para organizar esta homenagem baseada em doações privadas; e viviam na cidade na trágica data e nos anos seguintes.
O último ponto era fundamental, já que os anos que se seguiram ao choque inicial foram duros para Dallas, que carregou o estigma de "cidade do ódio" e enfrentou um profundo ressentimento por parte de muitos americanos.
"Os dias posteriores foram horríveis para a cidade, que de repente foi denominada cidade do ódio, que não é de modo algum como eu a via", explicou à Agência Efe Linda Custard, vice-presidente da fundação que organiza a homenagem.
Custard, que é da sétima geração de sua família a viver em Dallas, lista todas as experiências que seus conhecidos, amigos e inclusive ela mesma sofreram nos anos seguintes à tragédia por ser de onde eram.
Uma vendedora em Nova York, por exemplo, se negou a vender um produto ao ver um endereço de Dallas no cartão. Um taxista fez seus clientes saírem do carro ao descobrir que vinham da cidade texana. E, ao viajar para a Europa no verão de 1964, Custard diz ter ouvido comentários "ressentidos" sobre a cidade.
"Na verdade, quem o matou viveu muito pouco tempo em Dallas, não era daqui", diz ela sobre Lee Harvey Oswald.
Após décadas lembrando de forma tímida e discreta os sucessivos aniversários do assassinato de Kennedy, desta vez Dallas optou por investir em eventos, mobilizou milhares de voluntários e, há um ano e meio, planeja esta semana.
Os atos de homenagem enfocam menos a tragédia e as conspirações que a cercam e mais "uma figura mundial, extremamente admirada, que significou uma grande perda para o país e para toda uma geração", ressalta Custard.
A cidade quer acabar de uma vez por todas com o trauma. Será sua tentativa definitiva, após dar grandes passos nos anos 70 graças às vitórias de seu time de futebol americano, os Dallas Cowboys, e à mítica série "Dallas", que substituiu a história do ódio pela do clã petroleiro.
Ao mesmo tempo, a Fundação Comemorativa do Presidente John F. Kennedy deu um destaque especial para os que viveram esse assassinato público, televisionado e súbito, para que contem suas experiências durante estes dias.
A presidente da fundação, Ruth Altshuler, é provavelmente o melhor exemplo, pois em seus 89 anos de vida a figura de Kennedy cruzou várias vezes seu caminho.
Primeiro através de seu segundo marido, Charles Sharp, que teve como aluno em algumas disciplinas da Marinha um jovem John F. Kennedy; depois nesse inesquecível 22 de novembro de 1963, quando era uma das milhares de mãos que saudavam a comitiva presidencial.
Mas o que Ruth Altshuler não sabia na época é que um convite para ser uma das primeiras mulheres em Dallas a fazer parte de um júri popular a tornaria um dos cidadãos que julgou o assassino do assassino de Kennedy, Jack Ruby, condenado por ter matado Lee Harvey Oswald pouco após a morte do presidente.
E sua história voltará a se cruzar com a de Kennedy agora. Aos 89 anos, ela presidirá o ato de homenagem em Dallas meio século após o assassinato do presidente.
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