Repressão foi 'crime', afirma embaixador
Membros do governo ucraniano terão que responder pelos crimes cometidos nos últimos dias, durante os confrontos que deixaram 77 mortos no país.
Quem afirma é alguém do próprio governo, o embaixador da Ucrânia na ONU, Yuriy Sergeyev. "Foi um crime dos que usaram a força", disse o diplomata, que foi vice-chanceler do presidente Viktor Yanukovich, à Folha, em Nova York.
Para ele, é preciso que haja uma investigação completa, para explicar por que a lei antiterrorismo ""que permitiu o uso da força"" foi aplicada e de onde partiram os tiros que mataram manifestantes pacíficos.
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Folha - Como o senhor explica a repressão violenta do governo aos protestos?
Yuriy Sergeyev - Os militares usaram a força por meio da lei antiterrorista porque consideraram que as pessoas que estavam nas ruas eram terroristas. Só que a mesma lei os proíbe uso de força contra manifestantes que estejam defendendo os direitos humanos. Então é uma questão de interpretação. O governo interpretou os manifestantes como extremistas.
A decisão do Parlamento já é diferente: ela avalia que eles não eram extremistas, mas manifestantes pacíficos protestando por direitos humanos. E que havia um grupo de pessoas no meio incitando a violência.
Então houve um erro de interpretação?
Não foi um erro, foi um crime. Foi um crime dos que usaram a força. Havia atiradores não identificados, e rumores dizem que eles poderiam ser das forças do governo, da polícia ou do serviço secreto, bem como estrangeiros ou baderneiros. Pessoas morreram dos dois lados, então é preciso investigar. Mas as principais críticas, é claro, recaem sobre o governo. Em qualquer lugar, proteger a população é a primeira responsabilidade de um governo, e isso não aconteceu.
Membros do governo devem responder por esses crimes?
Não só. Tem que haver uma investigação. Mas dentro do governo, com certeza [terão que responder], já que é preciso explicar por que a lei antiterrorismo foi aplicada.
A decisão de acionar a lei antiterror não é, em última instância, do presidente?
Diretamente, não. Ela pode ser tomada pelo ministro do Interior e o ministro do Serviço Secreto, sem qualquer consulta [ao presidente].
O acordo alcançado entre o governo e oposição pode, de fato, pôr um fim à violência?
Depois que o acordo foi atingido, todo o processo avançou. O Parlamento retomou a Constituição de 2004 ""que limita os poderes do presidente.
Eles também adotaram uma lei por meio da qual a ex-premiê [Yulia] Timoshenko pode ser libertada, e retiraram o ministro do interior. O caminho para a estabilidade está aberto.
Só que os manifestantes seguem pedindo a renúncia do presidente.
Algumas pessoas que estão nas ruas vão continuar fazendo exigências, mas elas também devem ser responsabilizadas, porque isso pode criar novos confrontos. Com o Parlamento no poder, há uma possibilidade de se fazer mais e de forma mais pacífica. Os manifestantes podem pedir o que eles quiserem, mas não podem trazer a ameaça de mais violência.
Mas o presidente conseguirá seguir no posto sem apoio?
Ele foi legalmente eleito e cabe a ele decidir se renuncia ou não –ou ao Congresso pedir o seu impeachment.
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