Sob tensão militar, começa referendo na Crimeia para aprovar anexação à Rússia
Começou às 8h deste domingo (3h no horário de Brasília) o referendo na Crimeia que deve aprovar sua anexação ao território russo.
A votação vai levar 12 horas. O governo da península quer divulgar até o fim da noite o resultado para começar a pôr em prática as promessas de oficializar a mudança, incluindo a nacionalização de empresas ucranianas e a troca da moeda local pela russa.
A Crimeia pertence oficialmente à Ucrânia, cujo governo não reconhece o referendo, convocado após a queda do ex-presidente ucraniano, Viktor Yanucovich, aliado de Moscou. Espera-se que a população, de maioria russa, vote em peso para deixar a Ucrânia e virar parte da Rússia - especula-se em aprovação de até 90% dos eleitores.
Ontem, a população na capital Simferopol já celebrava o resultado mesmo antes da contagem de votos. Centenas de pessoas carregavam bandeiras russas e da Crimeia na Praça Lênin em meio a um show cultural num palco. A Folha circulou pela cidade e não encontrou campanha a favor da Ucrânia. No fim da noite, por volta das 23h, soldados encapuzados ligados à Rússia patrulhavam as ruas do centro.
O processo do referendo convocado às pressas tem sido pouco transparente e marcado pela presença militar. Observadores internacionais encontraram resistências para acompanhá-lo de perto, assim como a imprensa estrangeira é monitorada, sendo inclusive orientada oficialmente a não publicar informações negativas. Na noite de ontem, soldados encapuzados invadiram o Hotel Moscou, onde parte da imprensa estrangeira está hospedada em Simferopol. Segundo o governo da Crimeia, foi apenas um "alarme falso".
O governo da Ucrânia acusou ontem tropas de Moscou de ter entrado no país e tomado uma usina de gás. Segundo Kiev, 80 militares tomaram a vila de Strilkove usando quatro helicópteros e de três blindados. Não houve disparos. Uma declaração atribuída a um oficial russo diz que a ação visou a proteção de uma estação de gás contra ataques "terroristas". O governo russo não se manifestou. Em nota, o da Ucrânia disse que "se reserva o direito de usar todas as medidas necessárias contra a invasão militar da Rússia".
Em meio a esse contexto político, paira uma incerteza entre os 2 milhões de moradores da Crimeia: o que acontecerá a partir de amanhã? Com apoio dos EUA e de potências ocidentais, o governo da Ucrânia considera o referendo ilegal. Já o presidente da Rússia, Vladimir Putin, vai dizer que respeita a decisão da população e, diante de um resultado favorável, sinalizar apoio para anexar a Crimeia. Teme-se que, enfim, possa começar algum tipo de confronto militar entre os dois países, algo que até agora tem ficado no campo da retórica, com ações estratégicas e ameaças de cada lado. A tensão começa a crescer no leste da Ucrânia, onde é grande o número de pessoas pró-Rússia. Na sexta, duas pessoas morreram em Kharkiv, em confrontos entre militantes pró-Ucrânia e pró-Rússia.
A península foi anexada à Ucrânia em 1954 durante a formação da União Soviética. Em 1991, na independência ucraniana, continuou da mesma maneira, como uma república autônoma ligada a Kiev. Entretanto, ao menos 60% da população da Crimeia é de origem russa. Após a queda do então presidente da Ucrânia, Viktor Yanucovih, aliado de Putin, no mês passado, o grupo político pró-Rússia tomou o poder na Crimeia e aprovou a anexação dela a Moscou, convocando o referendo para a população ratificar a decisão.
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