Referendo sobre permanência na UE definirá futuro de premiê britânico
Ao anunciar a data em que o Reino Unido decide se fica na União Europeia (UE) ou sai do bloco, o primeiro-ministro David Cameron afirmou que esta será a decisão mais importante da vida de toda uma geração. Tal retórica diz muito sobre seu futuro político.
Por trás do referendo, marcado para 23 de junho, está também uma disputa pela liderança do Partido Conservador e, consequentemente, por um dos mais importantes endereços da capital inglesa: o número 10 da rua Downing, a residência oficial e o escritório do primeiro-ministro.
Rick Findler/AFP | ||
O primeiro-ministro britânico David Cameron discursa antes de eleições regionais no Reino Unido |
"Não acho que Cameron seja capaz de evitar sua perda de poder se o Reino Unido votar a favor do 'Brexit' [saída da UE]. Sua posição se tornará insustentável, e seu próprio partido forçará uma eleição para trocar a liderança", afirma Panicos Demetriades, professor da Universidade de Leicester.
DUAS FACES
Ao mesmo tempo em que Cameron se transformou na principal face do "não" ao "Brexit", o atual prefeito de Londres, Boris Johnson, passou a defender o "sim" de forma escancarada. Johnson hoje lidera com folga as pesquisas internas para ser o próximo comandante da legenda.
Cameron alerta para os efeitos na economia se o Reino Unido deixar a UE, como a dificuldade de captação de crédito e a perda de acesso ao mercado único. Johnson, por sua vez, afirma que o país pode ser como o Canadá e negociar acordos individuais com melhores tarifas.
A divisão interna reflete o quão polarizada está a disputa entre os britânicos em relação ao "Brexit" –pesquisas indicam empate técnico.
"Há evidências de que deixar a UE prejudicará a economia e reduzirá o padrão de vida britânico. Ainda assim, as pesquisas sugerem uma disputa acirrada", diz o professor Thomas Sampson, da London School of Economics.
Cameron investe pesado na campanha. Gastou £ 9 milhões (cerca de R$ 45 milhões) para produzir panfletos contra o "Brexit" com o timbre oficial do governo e distribuí-los nas casas dos eleitores. Também contou com uma declaração oficial e incisiva de apoio do presidente dos EUA, Barack Obama.
Por isso, para Sampson, Cameron colocou sua "reputação em risco" ao defender de forma tão veemente a permanência no bloco.
Até defensores do premiê opinam que haverá muita pressão para que ele deixe o cargo em caso de derrota.
Ponderam, contudo, que isso não necessariamente ocorrerá, uma vez que Cameron ainda desfruta do crédito de ter conduzido os conservadores a uma vitória sólida e inesperada no ano passado, quando ganhou maioria absoluta no Parlamento.
Na quarta (4), quando foi ao Congresso defender a permanência na UE, Cameron foi questionado se conseguiria ficar no cargo se não evitasse o "Brexit". A resposta foi curta e direta: "Sim. Lembre-se que venci as eleições há apenas um ano".
LONGO IMPACTO
Apesar de atrelarem a permanência de Cameron ao referendo, especialistas acreditam que, caso a opção pelo "Brexit" vença, não haverá mudanças imediatas.
A Comissão Especial da Casa dos Lordes, no Parlamento, calcula que a renegociação dos termos de saída pode demorar anos ""mas alerta que, uma vez iniciado o processo, não há fundamento legal para interrompê-lo. As mudanças no Partido Conservador também não devem ser instantâneas.
"Nas primeiras semanas pós-referendo, o impacto pode ser pequeno, mas vai aumentar à medida que a incerteza pesar sobre a economia", diz o professor Demetriades.
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