Em relatório, Macri apresenta conta herdada de Cristina Kirchner
Como havia prometido há três meses em discurso ao Congresso argentino, o presidente Mauricio Macri apresentou nesta sexta (3) um relatório com um diagnóstico detalhado sobre a situação deixada por Cristina Kirchner em áreas como saúde, educação, economia e segurança.
Até a conclusão desta edição, a a ex-presidente Cristina Kirchner não havia comentado o documento.
Daniel Dabove - 30.abr.2016/Xinhua | ||
O presidente da Argentina, Mauricio Macri, discursa nas comemorações pelo Dia do Exército no país |
Entre os dados apresentados estão as alegações de que 400 mil pessoas que já morreram ainda recebiam por serviços de saúde e de que, só em 2015, mais de 13,5 bilhões de pesos (R$ 3,4 bilhões) destinados à habitação teriam sido usados em "questões que não têm nada a ver" com construir casas.
"Em dezembro de 2015, o Estado argentino tinha pouca capacidade para atender suas obrigações, governado pela inércia, pela indiferença e pela corrupção do que pelo espírito de reforma, o profissionalismo e o serviço público", diz a introdução.
O diagnóstico diz tomar como base relatórios feitos por ministérios e outros organismos estatais já sob sua gestão, a partir de documentos de 2015 (ele tomou posse em dezembro). Segundo o atual governo, o texto ainda está incompleto e deverá ser alimentado ao longo deste ano.
Os dados compilados mostram ainda que 60% das famílias que já moravam em residências obtidas por meio de programas sociais não tinham título de propriedade.
Na área de Educação, o governo mantinha, no fim de 2015, dívida de 3 bilhões de pesos (R$ 765 milhões) com as universidades públicas, alega o relatório.
Na economia, a atual gestão critica a concessão de subsídios, cujo custo no ano passado teria sido 120 vezes maior que em 2008, e as restrições ao câmbio, que prejudicaram a agricultura e o comércio exterior.
Como resultado, o país teve dificuldades para gerar empregos, fazendo com que 51% da população economicamente ativa esteja fora do mercado formal. Ao mesmo tempo, o número de servidores públicos cresceu 64%.
Além do montante de dívidas e do gasto público com servidores, o relatório descreve gastos com publicidade oficial que chegaram a 2,2 bilhões (R$ 561 milhões), mais que o dobro do que foi aprovado pelo Congresso.
Com a Aerolíneas Argentinas, estatizada em 2008 por Cristina Kirchner e envolta em acusações de corrupção, o gasto teria sido de quase 30 bilhões de pesos (cerca de R$ 7,7 bilhões) entre 2008 e 2015.
A falta de dados dificultou as atividades dos novos ministérios. O governo diz que foi obrigado a fazer manualmente as transações de importação por três semanas porque todo o sistema antigo e suas informações foram apagados.
Prestes a completar seis meses na Presidência, Mauricio Macri não abandonou por nenhum dia o discurso de que as dificuldades do governo são decorrentes da "herança kirchnerista", como batizou os desequilíbrios socioeconômicos deixados pela antecessora.
O documento publicado na sexta reforça essa estratégia, que, segundo o analista político Jorge Giacobbe, da Giacobbe & Asociados, fortalece o mandatário. "Tudo que Mauricio fale que mostre os problemas deixados o sustenta", disse à Folha.
De acordo com Giacobbe, o apoio que o governo tem é mais de uma parte da população que desaprova Cristina do que por uma que admire Macri. "Nossas medições indicam que Mauricio conserva uma imagem positiva principalmente porque derrotou o kirchnerismo."
Hoje, 57% dos argentinos aprovam o presidente, segundo pesquisa da Giacobbe. No fim do ano passado, eram 62%.
Já o kirchnerismo tem o apoio de 25%. Em novembro, porém, o candidato de Cristina, Daniel Scioli, teve 49% dos votos. "O que aconteceu é que parte do peronismo também abandonou Cristina desde então."
USO POLÍTICO
No relatório, o governo Macri descreve o Estado governado pelo casal Kirchner (2003-15) como "desorientado", acusando-os de governar com base em critérios políticos, "como sustentação para a militância política".
"As instituições da República, em vez de controlar a gestão e evitar a corrupção, eram usadas às vezes como instrumento de luta política e foram desmontadas quando se tornaram ameaça".
Como exemplo citam a indicação de 41 torcedores organizados para uma autarquia do Ministério do Planejamento sem função clara e a prioridade nos créditos agrícolas e de pequenas empresas para aliados.
A ideologia também apareceu nos contatos internacionais. A Fábrica Militar de Munições produziu lançadores de foguetes para a Venezuela sem Caracas pagar a encomenda, diz o relatório.
Segundo o governo, ainda, a Chancelaria impedia registro físico ou eletrônico das diretrizes da relação com os EUA.
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