Greve geral na Guiana Francesa já dura dez dias e influencia eleição na França
A Guiana Francesa, território ultramarino da União Europeia espremido entre o Brasil e o oceano Atlântico, está sendo palco de uma onda de protestos e de greves que já dura dez dias.
Líderes sindicais que comandam as paralisações exigem que o governo francês faça um pagamento imediato de 2,5 bilhões de euros (R$ 8,3 bilhões) a seu departamento na América do Sul. Eles acusam Paris de ignorar os problemas da região, que oficialmente é um exclave da União Europeia no continente e usa o euro como sua moeda.
As tensões sociais na Guiana Francesa se transformaram até em um assunto da campanha presidencial francesa.
Jody Amiet/AFP | ||
Multidão se reúne do lado de fora da Prefeitura de Caiena, na Guiana Francesa, no último dia 30 |
Conhecida oficialmente como um departamento remoto da França, a Guiana Francesa está situada entre o oceano Atlântico e o Estado do Amapá. Do final do século 18 a meados do 20, a região abrigou uma imensa colônia penal.
Sua notória prisão da Ilha do Diabo teve como seus prisioneiros mais famosos o capitão do Exército francês acusado de traição Alfred Dreyfuss —protagonista do famoso "Caso Dreyfuss"— e Henri Charièrre, autor de "Papillon", romance supostamente autobiográfico.
A Guiana Francesa é também um local com vários problemas. A maioria de sua população de 250 mil pessoas não tem água encanada ou eletricidade. O desemprego é endêmico, atingindo 50% da população jovem, e o índice de homicídios é o maior entre os territórios franceses no exterior.
A principal parcela da população é mestiça, descendente de escravos e colonizadores franceses; há minorias francesas, haitianas, surinamesas, brasileiras e asiáticas. A língua oficial é o francês, mas a que predomina é o creole guianense francês.
O departamento francês é governado por uma autoridade territorial, exercida desde 2015 pela Assembleia da Guiana Francesa, eleita localmente.
A Guiana Francesa também tem problemas com a imigração ilegal, incluindo de brasileiros, alimentada especialmente pelo setor da mineração —o território tem jazidas de ouro. Algo que não é refletido pela renda per capita anual de US$ 15 mil, no mesmo patamar que a do Brasil —e metade da média da França.
PROTESTOS
Milhares de pessoas foram às ruas no último 28, em apoio à greve geral. Os protestos tiveram início quatro dias antes, quando 10 mil pessoas fizeram manifestações nas duas principais cidades do país, Caiena e Saint-Laurent-du-Maroni.
Foi o maior evento do tipo na história do país, e muitos trabalhadores permanecem de braços cruzados.
A paralisação causou uma série de transtornos, entre eles o fechamento da base espacial de Korou, adiando o lançamento de um foguete que colocaria satélites do Brasil e da Coreia do Sul em órbita.
No comando dos protestos está um coletivo conhecido como Os 500 Irmãos. Entre as principais reivindicações estão ainda mais segurança e amparo aos desempregados.
Em uma tentativa de acalmar os ânimos, o governo francês ofereceu um aporte de 1 bilhão de euros, mas o porta-voz dos 500 Irmãos, Olivier Goudet, disse que o grupo considera a oferta "insatisfatória", até porque os termos falavam em pagamentos ao longo de 10 anos.
A menos de um mês das eleições presidenciais na França, os problemas na Guiana Francesa não passam despercebidos pelos candidatos.
E o centrista Emmanuel Macron, um dos favoritos nas pesquisas, cometeu uma gafe ao descrever o território como uma ilha, embora tenha proposto novas políticas econômicas e melhorias na segurança da região.
Já a candidata da extrema direita, Marine Le Pen, disse que os problemas na Guiana Francesa são causados pela "imigração em massa".
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