Editorial: Terra à vista
Há 19 anos os astrônomos identificaram o primeiro planeta fora do Sistema Solar. Desde então, várias centenas de outros foram localizados. Na quinta-feira, porém, a agência espacial americana (Nasa) anunciou a descoberta tão esperada: o primeiro planeta similar à Terra, capaz, em tese, de sustentar formas complexas de vida.
Foi batizado de Kepler 186-f, nome do telescópio orbital que o identificou (o número indica a estrela que o planeta orbita, e a letra, sua posição entre os demais astros daquele sistema), mas vem sendo chamado de Terra 2.0. Apenas 10% maior do que o globo terrestre, quase certamente rochoso, esse corpo se encontra na "zona habitável", faixa na qual a água se mantém em estado líquido.
Existem cerca de 200 bilhões de estrelas em nossa galáxia, que é somente uma entre bilhões de outras. Sabe-se agora que parte expressiva desses astros conta com sistemas planetários semelhantes ao do Sol. Seria um absurdo estatístico caso a vida surgisse em apenas um desses incontáveis planetas, o nosso.
Além disso, verificou-se na própria Terra que certos microrganismos sobrevivem em condições extremas, o que torna plausível a suposição de que formas rudimentares de vida sejam comuns na galáxia, talvez até nos oceanos internos abrigados em luas de Júpiter e Saturno. Mas é provável que as condições necessárias à eclosão da vida complexa –plantas e animais– sejam mais raras.
Cientistas acreditam que a Terra foi favorecida sob outros aspectos, além da distância adequada até o Sol. Um satélite como a Lua, por exemplo, serve de para-raios nas chuvas de asteroides; a inclinação do planeta em relação ao próprio eixo propicia estações regulares.
O telescópio Kepler detecta planetas a partir da redução do brilho da estrela cada vez que eles passam entre nós e ela. Imagina-se que em cerca de dez anos os instrumentos permitam analisar a atmosfera de um planeta como o Terra 2.0 e inferir se ele contém vida e de que tipo.
Seria o maior achado de todos os tempos, mas sua repercussão prática seria pequena. Uma distância intransponível separa a Terra desses mundos (490 anos-luz no caso do Kepler 186-f; mais de quatro da estrela mais próxima ao Sol), o que parece suficiente para nos assegurar uma confortável solidão.
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