Editorial: Aids subestimada
Fez bem o Ministério da Saúde em direcionar ao público jovem a campanha lançada na segunda-feira (1º) por ocasião do Dia Mundial de Luta contra a Aids.
A epidemia, quando se considera a população como um todo, está estabilizada no Brasil. Em 2004, foram notificados 21 novos casos por 100 mil habitantes, número que passou a 20,4 no ano passado.
Quase 750 mil pessoas vivem no país com o vírus (HIV) ou desenvolveram a síndrome (Aids), mas os esforços para refrear a doença não têm contado com a participação juvenil. Na faixa de 15 a 24 anos, a proporção de infecções subiu, saltando de 9,6 casos por 100 mil habitantes em 2004 para 12,7 no ano passado –aumento de 32,3%.
Várias razões tornam esse grupo especialmente vulnerável ao vírus. Jovens tendem a ser mais impulsivos e menos cautelosos que adultos; entre eles, além disso, é mais comum o uso de substâncias que favorecem comportamentos de risco.
Ainda se deve ter em mente que um relacionamento sexual estável, menos provável entre jovens, pode ser fator de proteção contra a Aids.
Existe, contudo, um motivo que causa particular preocupação. Há indícios, ainda que anedóticos, de que as pessoas estejam perdendo o medo dessa enfermidade.
Quando a epidemia eclodiu, nos anos 1980, um diagnóstico da síndrome equivalia a uma sentença de morte. A partir de 1995, com os primeiros coquetéis antirretrovirais eficazes, a Aids foi se tornando uma doença crônica. Hoje, é possível evitar a infecção após situações de risco, como relações sexuais desprotegidas e acidentes com objetos contaminantes.
Quem tem memória dos primeiros anos da Aids percebe com clareza sua gravidade; para os jovens, talvez ela não se diferencie tanto de outras doenças sexualmente transmissíveis (DSTs).
Trata-se, evidentemente, de uma percepção equivocada. Enfrentar a Aids ainda é custoso, exige muita disciplina e gera uma série de efeitos adversos que podem roubar anos de vida dos pacientes.
Ou seja, o relativo descaso de alguns segmentos em relação à Aids é um efeito colateral do sucesso da medicina em mantê-la sob controle. Evitar que essas conquistas tragam prejuízos imprevistos passa a ser o desafio a partir de agora.
Embora não soe simpático, instilar um saudável temor entre os jovens pode ser a terapia indicada. Doses pequenas de medo às vezes são mais eficientes que toneladas de boa informação para motivar as pessoas a fazer a coisa certa.
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