Editorial
Regular, não proibir
Não constitui surpresa nem novidade a controvérsia sobre os aplicativos que conectam motoristas autônomos a passageiros. Ao longo da história, sempre houve resistência corporativista diante de avanços tecnológicos capazes de modificar as relações estabelecidas num determinado mercado.
É precisamente esse o caso das "caronas pagas". Apresentando benefícios como tarifas mais baixas, preços definidos por antecipação ou carros melhores, o serviço ocupa fatias de um território que há pouco tempo parecia refratário à livre disputa comercial –e o faz com inegável sucesso.
A empresa mais conhecida, Uber, começou a funcionar em 2010, em San Francisco (EUA). Cinco anos depois, chegou a 58 países e 320 cidades, com valor de mercado em torno de US$ 40 bilhões (em recente lista da revista norte-americana "Forbes", a Petrobras aparecia com US$ 44,4 bilhões).
Considerada a força da concorrência, a aguerrida reação dos taxistas era previsível. Em São Paulo, onde o aplicativo entrou em operação no ano passado, escavam-se trincheiras no Judiciário e no Legislativo –as batalhas nas duas frentes permanecem sem desfecho.
Verdade que, por atuarem em um limbo normativo no Brasil, os motoristas autônomos não precisam cumprir as mesmas exigências que os taxistas, como dispor de um alvará e submeter-se às regras estabelecidas para o transporte público individual remunerado.
Daí decorre boa parte das vantagens competitivas apresentadas pelos aplicativos, embora os profissionais a eles vinculados não tenham descontos na compra do carro nem isenção do IPVA.
Resolver tais diferenças pelo veto à modalidade privada, porém, serviria apenas para reforçar a reserva de mercado para um serviço caro e, em muitas cidades, ineficiente.
O melhor caminho é regulamentar a atividade mediada por empresas como a Uber e criar mecanismos de equalização entre os serviços a fim de reforçar a concorrência.
A legislação brasileira está defasada. Datada de 2011, não leva em conta as possibilidades geradas por essa nova tecnologia.
Há muito espaço para melhorar. De acordo com um sindicato de São Paulo, o deficit de táxis na cidade monta a 12 mil carros (são cerca de 34 mil legalizados). Um dos sintomas é a venda ilegal de alvarás, cujo valor passa de R$ 100 mil.
Prefeitos e vereadores que se preocupam com a população não podem impedir a entrada de novos atores nesse palco. Devem, ao contrário, regulamentar as "caronas pagas", criando regras que aumentem a segurança do usuário e protejam seus interesses, entre os quais está a melhoria dos serviços.
Em plena revolução digital, os moradores da cidade não podem ser privados de um benefício apenas para que parte de uma categoria mantenha privilégios decorrentes da reserva de mercado.
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