editorial
Radicalização moderna
Em seu derradeiro discurso sobre o Estado da União, o presidente Barack Obama enfatizou a política.
Claro que, como é normal nessas comunicações anuais que o chefe do Executivo dos Estados Unidos faz ao Congresso (e à nação), Obama abordou quase todos os grandes temas. Falou sobre economia, relações internacionais, imigração e inovação, sempre apontando para um futuro otimista.
No atacado, o presidente tem razão. Os EUA estão hoje melhor do que há sete anos, quando Obama assumiu em meio à pior crise econômica desde 1929. O país saiu da recessão e está em franca recuperação, ainda que a retomada tenha sido lenta e que vários setores da sociedade tenham empobrecido.
No front externo, o legado do democrata é mais controverso. Verdade que Obama selou o acordo nuclear com o Irã, reatou laços diplomáticos com Cuba e deixou para trás o unilateralismo que caracterizou o período de George W. Bush.
A coleção de fracassos da atual administração, contudo, não é pequena; vai do descumprimento da promessa de fechar a prisão de Guantánamo aos erros graves no Iraque e na Síria que impulsionaram o Estado Islâmico.
Para além dessas questões dirigidas sobretudo ao público interno, Obama lançou reflexões acerca da polarização partidária –e este foi o ponto alto do discurso.
Sua gestão foi marcada por uma acrimônia entre democratas e republicanos que há muito não se via. Em diversas ocasiões, a divisão paralisou a administração e tornou bem mais difíceis iniciativas do Executivo que, em outros tempos, teriam se tornado projetos bipartidários, recebendo modificações construtivas do Legislativo.
O acirramento se explica em parte por razões locais. Obama mencionou o hábito de políticos norte-americanos de redesenhar distritos eleitorais de modo a beneficiar seu partido, produzindo legisladores cada vez mais radicais.
O problema não é exclusivo dos EUA. Vê-se a exacerbação das cisões ideológicas em todos os lados do planeta, inclusive no Brasil.
Por ser fenômeno incipiente, não há estudos conclusivos a seu respeito, mas já se especula que o advento de comunidades virtuais esteja envolvido. A internet facilita o encontro de pessoas com afinidades ideológicas, e é sabido que, quando grupos de indivíduos com ideias semelhantes interagem, crescem a radicalização e a animosidade.
Nos EUA, mas não só lá, caberá às maiorias não radicais, que sempre deram as cartas na democracia, encontrar meios de contornar esse efeito adverso da modernidade.
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