Marcos Costa
Reestruturação da política energética
Nos últimos anos, o Brasil acompanhou diferentes debates alertando para a necessidade de diversificação da matriz energética brasileira.
Atualmente, esforços nessa área são ainda mais necessários se pensarmos no cenário econômico desafiador enfrentado pelo setor industrial, segmento este que consome aproximadamente 37% da energia produzida no Brasil, segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Garantir o fornecimento de energia oferece flexibilidade e estabilidade à produção industrial, cujos custos com energia subiram 43,9% no terceiro trimestre de 2015, se comparado com o mesmo período do ano anterior, dados estes da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
O modelo de geração brasileiro, que possui 90% de sua produção em hidrelétricas e termelétricas, tem se mostrado eficiente nos últimos quinze anos - desde quando foram erguidas as primeiras termelétricas para operarem como back-up ao sistema hidrelétrico. Porém, de agora em diante os esforços devem considerar formas de complementar a matriz energética.
Fatores climáticos, como grandes períodos de estiagem, não podem afetar a produção energética, e auxiliar na redução de 37% do índice de emissões de gases de efeito estufa, meta assumida na conferência do Clima em dezembro de 2015, torna-se inexorável.
Uma das saídas para complementar a matriz está nos canaviais, granjas, fazendas, estações de tratamento de efluente e aterros sanitários que diariamente recebem toneladas de material orgânico que, se reaproveitados, podem ser utilizados como combustível para geração de energia. Atualmente a capacidade instalada de geração de energia por biomassa é de 13.000 MW.
Segundo a ANEEL, até 2019, a previsão é de que a biomassa instale somente 2.770 MW no Sistema Interligado Nacional (SIN), menos da metade do que foi instalado entre 2010 e 2014, o que mostra a necessidade de investimentos nessa área.
A ausência de políticas públicas mais claras e a falta de incentivos que façam com que setores interessados se adequem a programas ambientais, a exemplo da Política Nacional de Resíduos Sólidos, leva hoje caminharmos no sentido de "enterrar" energia em lixões a céu aberto ou em aterros sanitários sem infraestrutura para transformar lixo em energia.
De modo similar, o efluente gerado da atividade humana e da atividade industrial vem sendo subutilizado no atual modelo, que joga luz à necessidade de produção de água de reuso a partir do efluente sem considerar que, em outra mão, a matéria orgânica separada da água pode ser utilizada para geração de energia, conceito que na indústria chamamos de waste to energy.
Em uma visão geral, precisamos olhar o setor de biomassa com os mesmos olhos que passamos a enxergar o setor eólico nos últimos anos. Incorporada à matriz elétrica em 2009, a criação de leilões específicos para a fonte foi crucial para a expansão do setor. Segundo o Plano Anual da Operação Elétrica (PEL), elaborado em dezembro de 2015 pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) em 2016 serão adicionados mais de 2,7 mil MW de energia eólica ao parque elétrico, o equivalente a 36% de toda a capacidade já instalada pelas usinas de vento do país.
Analisando o aspecto ambiental da fonte de geração eólica, com uma capacidade instalada de 8,12 GW, a força dos ventos é responsável por evitar a emissão de mais de 14 milhões de toneladas de CO2 à atmosfera, o que representa o mesmo que retirar das ruas 9 milhões de automóveis, segundos dados da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica). Até 2020, se comprovadas as previsões, a energia eólica passa a ser a segunda fonte isolada em geração de energia do Brasil, com 12%.
Em análise similar, governo, indústria e sociedade precisam caminhar no sentido de adotar iniciativas de eficiência energética, uma questão tão importante e estratégica quanto reavaliar a composição do parque gerador. Segundo a Associação Brasileira de Serviços de Conservação de Energia (Abresco), de 2010 a 2015 o desperdício de energia elétrica custou ao país mais de R$ 12 bilhões.
Mudar este cenário passa por diferentes aspectos, desde modernizar linhas de transmissão e distribuição a fim de evitar perdas não-técnicas, incorporar tecnologias inteligentes para a gestão dos ativos de energia (smart grid), até incentivar a troca de sistemas de iluminação públicas por LED, o que se feito em todas cidades brasileiras acarretaria na economia equivalente ao consumo anual total (iluminação pública e privada) de duas cidades de Belo Horizonte.
Os integrantes da cadeia energética precisam ter em mente que promover a diversificação da matriz elétrica deve levar em consideração o custo de geração das fontes, sua confiabilidade operacional e sua implicação ambiental, fatores estes primordiais para a indústria. Nossas decisões não afetam apenas o setor elétrico. Auxiliar a reaquecer o setor industrial é movimentar todo um setor fundamental para o país voltar a crescer.
MARCOS COSTA é líder de Contas Estratégicas para os Negócios de Energia para América Latina da GE
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