editorial
Omissão e insegurança
Embora obrigatório desde 1997 para motoristas e passageiros, o uso do cinto de segurança ainda está longe de ter-se universalizado no país —um fenômeno que atinge sobretudo os ônibus, como mostrou reportagem desta Folha.
No acidente trágico com um coletivo na rodovia Mogi-Bertioga, em São Paulo, que causou a morte de 18 pessoas, muitos dos passageiros estavam sem a proteção.
Segundo pesquisas da Artesp (agência de transportes de SP) em 2015, o índice dos que ignoram a proteção é de 9% entre motoristas de carro, 38% entre os ocupantes do banco traseiro e 60% entre usuários de ônibus intermunicipais.
A inobservância contribui para o aumento da carnificina do trânsito nacional, que todos os dias deixa cerca de 120 mortos e mil feridos. Em 2013 (dado mais recente), 42,3 mil vidas foram interrompidas nas ruas e estradas do país.
Tais cifras deveriam suscitar reação imediata dos governos nas três esferas de administração, mas há anos as autoridades dispensam ao assunto inexplicável descaso.
Em 1980, o Brasil exibia uma taxa de mortes no trânsito de 17 por 100 mil habitantes, menor que a da Austrália, dos EUA e da França e equivalente à da Itália, da Espanha e da Polônia. Três décadas depois, em todos esses países o índice caiu para menos de 10 por 100 mil, ao passo que, no Brasil, ela aumentou para 22 por 100 mil.
Descontado o impacto de fatores como alterações demográficas e tamanho da frota, o sucesso dessas nações não comporta segredos. Resulta de investimento de longo prazo envolvendo engenharia de tráfego, intensas campanhas de conscientização, fiscalização ininterrupta, rigor punitivo e melhorias tecnológicas nos veículos.
O Brasil falha em maior ou menor grau em todos esses aspectos.
A falta de uso do cinto de segurança em ônibus, por exemplo, não tem sido fiscalizada com rigor pelo poder público. Nos três primeiros meses do ano, realizou-se cerca de 1,2 milhão de viagens nas estradas federais, mas apenas 194 multas foram aplicadas, o que representa 0,016% dos deslocamentos.
Ademais, segundo especialistas, mesmo que usassem o cinto de segurança, os passageiros não estariam totalmente livres de perigo, pois o modelo disponível nos coletivos –de dois pontos, e não de três– oferece proteção precária.
Pior, um projeto de lei que tornava o dispositivo mais seguro obrigatório nos ônibus foi arquivado no Congresso no ano passado.
Enquanto as autoridades se omitem, o trânsito brasileiro segue produzindo tragédias e ceifando vidas.
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