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Mortes no Mediterrâneo
Às vésperas do Natal, cerca de 90 pessoas se afogaram após dois naufrágios na rota entre a Líbia e a região italiana da Sicília. Com isso, o número de imigrantes e refugiados mortos no Mediterrâneo ao longo de 2016 passou de 5.000, segundo a ONU. Supera com folga as 3.771 vidas perdidas um ano antes, cifra que já havia sido recorde.
Apesar do novo marco fúnebre, diminuiu o total de pessoas que chegou à Europa: de pouco mais de 1 milhão em 2015 para cerca de 360 mil em 2016. Reduziu-se o fluxo de seres humanos em fuga desesperada, mas a viagem mostra-se mais perigosa, com o emprego de barcos em péssimas condições.
Os acidentes fatais demonstram quão distantes estão os países europeus de dar uma resposta à altura da crise humanitária.
Para piorar, difunde-se o sentimento de hostilidade contra imigrantes no continente. Na Alemanha, por exemplo, o envolvimento de um tunisiano no atentado recente que matou 12 pessoas num mercado de Berlim alimentou as correntes contrárias à política generosa da chanceler Angela Merkel.
No Reino Unido, o desejo de maiores restrições a imigrantes ajuda a explicar a vitória do brexit (junção das palavras "Britain" e "exit", saída em inglês) no plebiscito de junho, quando os britânicos decidiram deixar a União Europeia.
É difícil encontrar o equilíbrio entre o acolhimento de pessoas oriundas de zonas conflituosas e a adoção de estratégias contra ataques de terroristas ligados ao extremismo islâmico, mas a tarefa adquire ainda maior premência porque não há sinais de estabilização nos países de onde parte a maior parcela de imigrantes e refugiados.
Na África subsaariana, de países como Nigéria e Senegal saem trabalhadores em busca de melhores condições econômicas. Na Síria, 5 milhões de pessoas já deixaram o país por causa da guerra civil.
Diante desse cenário complexo, é auspiciosa a posse de António Guterres como secretário-geral da ONU. Após dez anos à frente da agência das Nações Unidas para refugiados (Acnur), o ex-premiê português tem a experiência necessária para coordenar a ajuda aos 21,3 milhões de refugiados em todo o mundo.
A tarefa, obviamente, não será fácil. A ONU precisará lidar com a ascensão de políticos avessos ao pensamento progressista e humanitário, incluindo o presidente eleito dos EUA, Donald Trump.
Nesse ambiente polarizado, está longe de ser descartado o risco de que 2017 conheça recordes ainda mais lamentáveis do que os registrados nos dois anos anteriores.
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