Paraísos e pecados
Yves Herman - 2.fev.2017/Reuters | ||
O mais recente vazamento de dados sobre estruturas financeiras em paraísos fiscais -apelidado de "Paradise Papers"- demonstra o continuado uso desse mecanismo por uma elite global de pessoas físicas e empresas, para esconder recursos ou pagar menos impostos.
Os documentos foram remetidos anonimamente a um jornal alemão, há cerca de um ano. Participaram da análise do material jornalistas de quase uma centena de veículos. O resultado dessa investigação veio agora a público.
Os dados compreendem 19 jurisdições -entre elas, ilhas do Caribe (como Bermuda e Cayman) e Malta. São citadas 25 mil pessoas jurídicas, entre empresas, fundações e outras modalidades. O Brasil aparece na 26ª posição, com 617 beneficiários domiciliados no país.
Ressalte-se, de início, que manter depósitos no exterior não constitui crime, desde que os valores estejam devidamente declarados. Mesmo quando os recursos têm origem lícita, contudo, não há dúvida de que um dos objetivos mais comuns é evitar a tributação.
O escrutínio dos paraísos fiscais se tornou crescente a partir de 2001, impulsionado pelo ataque terrorista às Torres Gêmeas em Nova York. Desde então, o governo norte-americano vem endurecendo sua legislação e pressionando outros países a fazerem o mesmo, de modo a dificultar o fluxo de dinheiro do crime.
Nos últimos anos, o movimento se ampliou para combater a evasão tributária de recursos lícitos, assunto que vai muito além dos paraísos fiscais. Acordos globais têm sido firmados para troca de informações e, em alguma medida, harmonização de normas.
Resta muito a fazer, porém. É difícil distinguir práticas normais dos negócios -que implicam o fluxo de capitais entre fronteiras- daquelas voltadas apenas para explorar brechas legais.
Muitos países ainda se utilizam de regras permissivas para atrair mais investimentos que outros.
A Irlanda é um exemplo: apesar de protestos da União Europeia, a nação é um destino atraente ao capital em razão de impostos amigáveis. Grandes empresas de prestígio mundial, como a Apple, têm sede lá. Até a notória JBS tentou mudar de domicílio fiscal, movimento vetado pelo BNDES.
A questão envolve moralidade pública e isonomia. Não é justo que alguns mais afortunados paguem menos tributos do que outros. Da mesma forma, há que evitar o jogo destrutivo dos países que praticam uma espécie de concorrência desleal para atrair empresas e investimentos a seu território.
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