Análise: Com omissão, Legislativo abre mão de exercer independência
A Constituição obriga o Congresso a apreciar o veto da Presidência da República "dentro de 30 dias a contar do recebimento".
Claro? Aparentemente sim. Mas, não tanto. O que se entende por "recebimento"? Quando começa a correr o prazo dos 30 dias?
Congresso define sistema de votação de vetos presidenciais que reduz força de Dilma
Quem definiu "recebimento" foi o Regimento Interno do Congresso. Recebimento ocorre "a partir da sessão convocada para conhecimento da matéria". A vinculação entre sessão e recebimento não é óbvia. E nela se escondeu a possibilidade de descumprimento da Constituição.
À Presidência não interessa que se derrube seu próprio veto. É óbvio. No presidencialismo dito de coalizão, a base aliada do governo, que controla o Congresso, em geral não convocava a sessão. Sem a sessão, não havia tecnicamente "recebimento". Sem recebimento, não corria prazo. Os vetos se perpetuaram. A vontade da Presidente se impôs. São 1.700 vetos não apreciados.
Assim, a Presidência ganhava através de vetos prorrogáveis indefinidamente. O Congresso muitas vezes se tranquilizou. Alguns vetos contrariavam os interesses das bases e eleitores passados e potenciais do parlamentar. Entre se opor à Presidência e defender seus eleitores, optava-se pela omissão. Com omissão, os eleitores não são representados.
O preço foi caro. O Congresso abriu mão de exercer sua própria independência. Querendo ou não, se deslegitimou diante da opinião púbica. Diminui-se a si próprio. Pode parecer paradoxo. Mas não apreciar os vetos não é um exercício do poder do Congresso. É justamente o contrário. Além de ser uma violação a um direito do eleitor. Que direito é este? O direito a separação e independência dos Poderes.
Agora, o Congresso passará a entender que "recebimento" ocorre no momento da publicação do veto no "Diário Oficial". Dispensa a convocação da sessão. Um avanço importante. Mas só daqui para frente. Será que o prazo de 30 dias do novo recebimento será cumprido?
JOAQUIM FALCÃO é professor de direito constitucional da FGV Direito Rio
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