Igor Gielow: Governo luta contra confluência de fatores
A pesquisa Datafolha publicada nesta quarta (18) colocou em números claros aquilo que o governo tinha registrado por meio de seus levantamentos semanais, baseados em consultas telefônicas e levantamentos qualitativos: a erosão da presidência de Dilma Rousseff é abrupta e tolhe o poder de reação do Planalto.
Não há muitos instrumentos à disposição do governo neste momento para estancar a hemorragia de popularidade da presidente, e mesmo ela qualificou de "mais do mesmo" a tentativa de reanimação do cadáver da reforma política e de um pacote anticorrupção promovida após os protestos do domingo (15).
A aposta do governo para inverter as curvas se resume a duas coisas que independem de sua vontade exclusiva e se contaminam de forma retroalimentada.
Primeiro, o Planalto crê, baseado nos resultados de janeiro, que o ajuste de Joaquim Levy pode dar certo. Só que para isso é preciso de apoio do Congresso, que está com a faca nos dentes contra o Planalto e tem seu comando peemedebista sob suspeição no âmbito da Operação Lava Jato. Medidas paliativas, por sua vez, não têm espaço fiscal.
Uma melhora no cenário econômico também passa pela publicação de um balanço crível da Petrobras, que talvez possa ajudar a evitar o rebaixamento do Brasil por agências de classificação de risco –algo que parece bem difícil, de todo modo. É nisso que o submerso Aldemir Bendine, presidente da estatal, trabalha agora.
VACCARI
O segundo fator é ainda mais imponderável: lidar com o fato de que os efeitos da Lava Jato estão na antessala de Dilma. As contas de sua campanha presidencial de 2010 serão escrutinadas com a queda do tesoureiro João Vaccari Neto na rede dos procuradores do Paraná. O PT, ao não afastá-lo liminarmente, mantém o problema perto do Planalto.
Em 2014, governistas argumentam que as contas presidenciais foram tiradas das mãos de Vaccari e passadas para o interventor de tesouraria Edinho Silva. Fato, mas não explicará nem 2010, nem os imensos recursos à disposição a partir da arrecadação feita nos anos entre os dois pleitos pelas empresas investigadas no petrolão.
Se é verdade que a blindagem ofertada pela Procuradoria-Geral da República, segundo a qual Dilma não pode ser investigada por atos ocorridos antes de sentar na cadeira presidencial, e também é fato que o ministro Teori Zavascki não viu nada de relevante contra ela nas investigações até aqui, isso tudo não afasta o risco de novas revelações.
Aí a questão deixa até de ser jurídica e passa para o campo meramente político, que está mais do que conturbado. Daí a correria no governo para reformar o ministério a fim de ampliar o espaço do PMDB e tentar garantir não só alguma estabilidade política, mas também a aprovação das medidas fiscais.
Como se lê nos parágrafos acima, todos os fatores confluem para uma única e grande confusão. Economia, ajuste, apoio no Congresso, PMDB rebelde, Lava Jato, desaprovação recorde e protestos nas ruas –fora o impacto ainda não estimado de atos como o do MTST desta quarta.
SEM CONTRA-ATAQUE
Até aqui, o Planalto não tem conseguido orquestrar um contra-ataque eficaz e que dialogue com essas variáveis interligadas de forma orgânica.
A oposição, por sua vez, vai tateando. Mantém a pressão pública ao insistir no STF para que Dilma seja investigada, o que parece pouco frutífero do ponto de vista jurídico.
Enquanto o tempo passa, o PSDB costura nas sombras um acordo de boa vizinhança com o PMDB, cujo "test-drive" de aliança está em curso na CPI da Petrobras. Há temores em associação direta com a dupla Renan Calheiros-Eduardo Cunha, mas o namoro está em curso.
O ensaio visa na verdade criar um cenário de contingência caso a situação efetivamente degringole para um impeachment e posse de Michel Temer (PMDB-SP), algo que cada dia que passa deixa de ser um fantasma assustador a ser invocado em passeatas e declarações públicas e migra para a categoria de opção na mesa.
O tempo corre contra Dilma.
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