Obras em SP e no Sul supriam caixa dois da Andrade Gutierrez, diz delator
Washington Alves - 19.jun.2015/Reuters | ||
Carro da Polícia Federal em frente à sede da Andrade Gutierrez, em Minas, em 2015 |
O engenheiro Dario Rodrigues Leite Neto, ex-diretor da Andrade Gutierrez, afirmou em delação premiada que o suposto esquema de pagamento de propina e caixa dois da empreiteira era abastecido por notas fiscais falsas emitidas na execução de obras em São Paulo e no Sul.
O depoimento do engenheiro foi dado na última quarta-feira (1º) à força-tarefa da Lava Jato no Rio.
Ele e outros dois funcionários passaram a colaborar com as investigações numa segunda rodada de depoimentos que a empreiteira foi chamada a fazer após a delação da Odebrecht apontar fatos que não haviam sido citados pela Andrade em seus acordos de delação e de leniência, firmados em 2015 e 2016 na Operação Lava Jato.
Os delatores disseram atuar na estrutura que envolveria uma "tesouraria interna" para pagamentos ilícitos, como mostrou reportagem da Folha neste domingo (5).
Leite Neto ocupou o cargo de diretor da Unidade de Negócios Sul da empreiteira, que atuava na região e em São Paulo. De acordo com seu depoimento, ele indicava ao gerente Marcelo Seabra de Mello, outro novo delator da Andrade, o valor das notas frias emitidas em nome das empresas ligadas a Adir Assad –doleiro preso desde agosto do ano passado.
A dinâmica descrita pelos novos delatores indica que a empreiteira pagava os valores descritos nas notas a empresas de Assad, com as quais mantinha contratos fictícios.
Semanas depois, Samir Assad ou Marcelo Abbud, operadores ligados a Adir, iam à empresa para devolver os recursos em dinheiro vivo.
"Cada obra de São Paulo e Sul tinha um percentual variável, a depender da rentabilidade da obra, para escolha da emissão de notas fiscais que resultariam na formação do caixa dois", afirmou Leite Neto, que disse ter recebido orientação da diretoria financeira para agir de tal forma.
MESADA
Sergio Lima - 28.ago.2012/Folhapress | ||
Em foto de arquivo, o empresário Adir Assad em depoimento a CPI em 2012 |
Ainda de acordo com a versão de Leite Neto, o responsável por receber o dinheiro vivo era o administrador José Geraldo de Lima, que também passou a colaborar com as investigações. O montante, contudo, sofria um desconto de 18% a 20%, referente a impostos e a uma "taxa" cobrada por Adir Assad.
Segundo Lima, o dinheiro ficava num cofre da área financeira da empresa.
O administrador relata que a frequência do envio de dinheiro era, no mínimo, mensal, mas podendo, em determinados momentos, ter ocorrido semanalmente. Os pacotes costumavam ter entre R$ 50 mil e R$ 300 mil.
O relato do ex-diretor da Andrade indica que o dinheiro desviado das obras de São Paulo e do Sul, que estavam sob seu comando, abastecia a propina paga em outros Estados, como o Rio.
"Mesmo antes de a Andrade Gutierrez fixar sede no Rio [em 2010], o dinheiro gerado com o caixa dois pelo esquema Assad também era encaminhado ao Rio", disse o ex-diretor em depoimento.
As delações da Andrade provocaram a primeira denúncia contra o ex-governador Sérgio Cabral (PMDB), preso desde novembro. Também fazem parte das investigações sobre a Eletrobras.
A existência do caixa dois já havia sido mencionada quando a Operação Irmandade foi deflagrada, em agosto do ano passado, tendo como alvo propinas na Eletrobras. Contudo, ainda não se sabia a extensão da contabilidade paralela da empresa.
Com as novas informações dos executivos da Andrade, ainda não foi definido se a multa de R$ 1 bilhão já fixada à empresa em seus acordos será ampliada.
Departamento de propina da Andrade Gutierrez
OUTRO LADO
Procurada, a Andrade Gutierrez disse, por meio de sua assessoria, que não iria comentar as informações prestadas pelo ex-executivo.
O advogado do doleiro Adir Assad, Miguel Pereira Neto, disse que a informação de que seu cliente abastecia o caixa dois da Andrade Gutierrez "já foi exposta na ação penal em trâmite na Justiça Federal do Rio de Janeiro, inexistindo fato novo".
Afirmou ainda que "o processo está em andamento e as questões serão dirimidas durante a instrução".
Também defensor de Samir Assad, irmão de Adir, e Marcelo Abbud, igualmente apontados como operadores do esquema, Pereira Neto diz que "as respostas à acusação foram apresentadas e a instrução se encontra em fase de oitiva de testemunhas".
Também afirma que "há vícios formais apontados pela defesa de todos os acusados, inclusive no tocante aos decretos de prisão preventiva, excessivos, desnecessários e sem utilidade ao regular andamento do feito".
Colaborou CAROLINA LINHARES, de Belo Horizonte
Livraria da Folha
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