Parecer da AGU abre caminho para governo avançar com exploração de petróleo na Foz do Amazonas

Ibama negou pedido da Petrobras em maio para estudos em bloco da margem equatorial

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Brasília e São Paulo

A AGU (Advocacia-Geral da União) concluiu um parecer jurídico que abre caminho para que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) avance com os estudos e a consequente exploração de petróleo na região da Foz do Amazonas.

O parecer, que havia sido solicitado pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, oferece mais um argumento ao governo ao defender que a chamada AAAS (avaliação ambiental de área sedimentar) não é indispensável e não pode sustar a realização de licenciamento para empreendimentos de exploração de combustíveis no país.

Lula e a ministra Marina Silva durante cerimônia no Palácio do Planalto - Pedro Ladeira - 5 jun. 2023/Folhapress

A necessidade dessa avaliação foi um dos pontos indicados pelo Ibama ao recusar pedido da Petrobras para iniciar os estudos de prospecção na região da Foz do Amazonas, em maio deste ano.

Em nota divulgada na noite desta terça, o Ministério do Meio Ambiente disse considerar a AAAS um importante instrumento técnico de planejamento econômico e ambiental, mas que o Ibama não indeferiu a licença para exploração do bloco em decorrência da ausência da AAAS.

"O indeferimento da licença ocorreu em razão de inconsistências nas informações prestadas pela empresa", disse a pasta.

Em nota, a AGU defende que há precedentes no STF (Supremo Tribunal Federal), em julgamentos recentes, que dão sustentação ao entendimento de que a viabilidade ambiental deva ser atestada apenas no licenciamento, não por meio de estudos de caráter estratégico, como a AAAS.

O ministério de Jorge Messias encaminhou ainda um pedido de abertura de processo administrativo de conciliação entre os órgãos envolvidos no assunto.

O tema será debatido na Câmara de Mediação e de Conciliação da Administração Pública Federal (CCAF), unidade da AGU e da CGU (Controladoria-Geral da União).

"Suas mediações têm obtido bons resultados, inclusive em casos de conflitos ambientais que extrapolaram o âmbito meramente jurídico, abrangendo o domínio de conhecimento técnico especializado", diz ainda a nota do ministério.

Nos próximos dias, segundo a AGU, a Câmara vai convidar os consultores jurídicos e representantes das altas cúpulas do Ministério das Minas e Energia e do Ministério do Meio Ambiente para discutir o tema e avaliar a viabilidade de conciliação. Se for o caso, a CCAF aceita o caso e emite parecer abrindo o processo de resolução de conflito.

A possibilidade de exploração de petróleo na Foz do Amazonas divide o governo. De um lado está a ala política e desenvolvimentista do governo, que vem argumentando que é necessário realizar estudos para identificar a existência do combustível na região, a viabilidade da eventual exploração e que tudo isso poderia ser feito com segurança, para evitar riscos ambientais.

Do outro, se coloca a área ambiental, liderada pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

A decisão final sobre a perfuração da Foz do Amazonas cabe ao Ibama, que já analisa um novo pedido da Petrobras. O parecer da AGU, no entanto, deve aumentar a pressão sobre o órgão ambiental.

Por outro lado, na última sexta-feira (18), o MPF (Ministério Público Federal) pediu que o Ibama negue a nova tentativa da Petrobras para obter licença para perfuração do bloco 59. A Promotoria afirma que adotará "medidas judiciais cabíveis" caso a recomendação não seja atendida.

O MPF fixou prazo de dez dias úteis, a partir da sexta-feira, para que o Ibama informe sobre o acatamento ou não da recomendação.

Para Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama, o parecer da AGU evidencia que "estão transformando uma decisão técnica numa decisão política".

"Remeter aspectos técnicos da licença para conciliação na AGU é esvaziar as atribuições do Ibama. Inaceitável", diz. "O Ibama não afirmou que a AAAS era obrigatória e que por isso estava rejeitando a licença. Afirmou que o estudo regionalizado é muito importante tecnicamente para que se possa decidir sobre empreendimentos na Foz."

Lula já sinalizou ser favorável à realização de estudos para detectar se há petróleo na região. No início de agosto, durante entrevista a rádios da Amazônia, afirmou que quer "continuar sonhando" com a exploração de petróleo na região.

"Nós tínhamos a Petrobras com uma plataforma preparada para fazer pesquisa nessa região. Houve um estudo do Ibama que dizia que não era possível, mas esse estudo do Ibama não é definitivo, porque eles apontam falhas técnicas que a Petrobras tem o direito de corrigir. Estamos discutindo isso", afirmou o presidente na entrevista.

O Ibama afirma que a região da bacia da Foz do Amazonas é de extrema sensibilidade socioambiental por abrigar unidades de conservação, terras indígenas, mangues e grande biodiversidade marinha.

Segundo o órgão, a área abriga espécies ameaçadas de extinção, como boto-cinza, boto-vermelho, cachalote, baleia-fin, peixe-boi-marinho, peixe-boi-amazônico e tracajá.

O poço que a Petrobras tenta licenciar foi adquirido na 11ª rodada de licitações da ANP (Agência Nacional do Petróleo), em 2013. Ele fica a 179 km da costa do Amapá.

O processo de licenciamento ambiental do bloco FZA-M-59 foi iniciado em 4 de abril de 2014, a pedido da BP Energy do Brasil, empresa originalmente responsável pelo projeto. Em dezembro de 2020, os direitos de exploração de petróleo no bloco foram transferidos para a Petrobras.

Essa foi a segunda negativa para atividades de perfuração na região —em 2018, o Ibama negou a emissão de licença para cinco blocos sob controle da empresa Total.

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