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Doutora em ciência política pela USP e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento

Enel e a recusa às privatizações

Reestatização vem sendo levada a cabo em diversos países por causa da indignação da população

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O apagão na cidade de São Paulo vem alimentando um intenso debate sobre a qualidade dos serviços prestados pela multinacional italiana Enel. Alvo de uma CPI na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, a empresa enfrenta agora uma nova CPI na Câmara Municipal da cidade, uma ação da Prefeitura de São Paulo e um inquérito instaurado pelo Ministério Público.

A indignação causada pela falta de luz prolongada foi de tal monta que a população foi às ruas protestar. No dia 7, em uma manifestação na avenida Giovanni Gronchi, zona sul da capital, moradores atearam fogo em objetos e bloquearam as pistas nos dois sentidos. Na região de Cotia, na altura do km 32 da rodovia Raposo Tavares, os protestos ocorreram por dois dias seguidos.

Após tempestade, São Paulo convive com falta de luz - Zanone Fraissat - 4.nov.23/Folhapress

Não foi a primeira vez que a empresa enfrentou revoltas populares. Em 2019, em meio a protestos que ocorreram no Chile, a sede da Enel em Santiago foi incendiada devido aos altos valores cobrados por serviços ruins. No mesmo ano, Ronaldo Caiado (União Brasil), governador de Goiás, tentou cassar a concessão da Enel no estado por conta da má qualidade dos serviços prestados.

Após o apagão em São Paulo, Caiado declarou que a privatização das empresas de energia não foi capaz de prestar bons serviços em nenhum estado. A empresa procurou se defender das críticas dizendo que a tempestade que ocorreu na capital paulista foi imprevista. Além disso, afirmou que os cortes que promoveu no número de funcionários nos últimos anos, 36% desde 2019, não teriam afetado a qualidade dos serviços prestados.

No entanto, os argumentos apresentados pelo presidente do Sindicato dos Eletricitários, Eduardo Annunciato, em entrevista ao jornalista Leonardo Sakamoto, são bem mais convincentes. Segundo Annunciato, o sindicato já havia alertado a empresa que, caso houvesse um ciclone extratropical, São Paulo poderia ficar uma semana sem luz.

Em sua avaliação, o problema reside na estratégia de redução de gastos empregada pela Enel, que dobrou seu lucro desde que assumiu a distribuição de energia em São Paulo. Em vez de investir na manutenção preventiva da malha elétrica como um todo, a empresa optou por religadores automáticos que isolam e fracionam defeitos da rede. O método pode funcionar bem em dias normais, mas não dá conta de eventos climáticos de grandes proporções. Além disso, a alta rotatividade dos trabalhadores terceirizados da empresa faz com que sua mão de obra seja menos qualificada para avaliar e atender problemas diversos.

Processos de reestatização de serviços essenciais vêm sendo levados a cabo em diversos países por conta da indignação da população. Desde 2000, 884 serviços já foram reestatizados no mundo, de acordo com o Centro de Estudos em Democracia e Sustentabilidade do Transnational Institute (TNI), sediado na Holanda.

E o Brasil não é exceção na recusa às privatizações. Ao fim do governo Bolsonaro, a opinião pública se alterou significativamente em relação ao tema. De acordo com a pesquisa "A Cara da Democracia", realizada pelo Instituto da Democracia e da Democratização da Comunicação, em 2018, 44% dos brasileiros entrevistados eram favoráveis às privatizações. Em 2023, o número caiu para 28%.

Isso ajuda a explicar porque ex-membros do governo Bolsonaro agora tentam barrar a privatização da Sabesp que vem sendo promovida a toque de caixa pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos). Resta saber se a improvável reunião da esquerda e grupos de direita tradicional e de extrema direita irá resultar, de fato, na formação de um necessário consenso contra a privatização de serviços essenciais e bens comuns.

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