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Coluna é assinada pelo jornalista e tradutor Daniel de Mesquita Benevides.

Descrição de chapéu América Latina

Mezcal, que tinha má reputação, se torna mais pop com dupla de 'Breaking Bad'

Bebida feita com a mesma planta usada na tequila aparece na obra 'À Sombra do Vulcão'; aprenda a fazer drinque

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"Discurso! Discurso!" Sala cheia, bandeirolas no teto, copos na mão. Walter White sobe num banco meio a contragosto. "Quando soube que tinha câncer, me perguntei: por que eu? Agora que estou curado, me pergunto: por que eu?".

A tirada filosófica do personagem de "Breaking Bad" cala a festa por alguns segundos. Perplexos, os convivas, acostumados a um churrasco negacionista, mergulham na profundidade da existência. O brinde pode esperar.

Muitos episódios antes, Mr. White, acreditando estar com pouco tempo de vida e preocupado em deixar dinheiro para a família, procura Jesse Pinkman, pior aluno de suas aulas de química: "Eu tenho a expertise, você tem os contatos". E propõe uma parceria para fazer a melhor metanfetamina que um junkie jamais provou. O resto virou lenda.

A história se repete no outro lado da tela —não como farsa, vamos torcer. Cansado da moleza pós-"Breaking Bad", Aaron Paul (Jesse) se encontra com o amigo Bryan Cranston (Walter) e devolve a proposta, desta vez com um produto legal: o mezcal (mais tarde ele seria escalado para o papel de Jack Daniel no cinema. O filme está em fase de produção).

O mezcal já teve má reputação, como a dupla da TV. Em parte, talvez, porque associado a bandoleiros de faroeste. Em parte por uma tentadora confusão com a mescalina, droga extraída do peyote (nenhum parentesco).

No final do século 18, uma reportagem da Scientific American alertava: "o mezcal é descrito como uma mistura de gasolina, gim e eletricidade. Tequila é pior: dizem que incita a badernas, assassinatos e revoluções".

A associação de mezcal e tequila é natural, já que ambas vêm do agave, planta típica do México, e só diferem substancialmente no preparo. São longínquas descendentes do pulque, um fermentado da mesma planta que fazia parte de rituais astecas. Há um mural de mais de dois mil anos que mostra Mayahuel, a deusa do agave, amamentando seus bebês-coelhos, entidades da embriaguez e da folia.

Cristalino como um espírito pré-colombiano, o mezcal dos nossos heróis chama-se Dos Hombres. É produzido de forma artesanal na pequena localidade de San Luis del Rio, em Oaxaca, sul do México. Um lugar não tão distante de Albuquerque, cenário de "Breaking Bad", também fundada por colonos espanhóis.

O vilarejo, por sua vez, fica ao lado de Cuernavaca, cidade que inspirou o romance "À Sombra do Vulcão", de Malcolm Lowry, tido como um dos mais importantes do século passado (acaba de sair uma nova tradução).

Tudo se passa no Dia dos Mortos, em 1938, época em que grupos paramilitares, inspirados pelos fascistas na Europa, aterrorizam camponeses indígenas (sim, soa familiar. Não à toa, certamente).

Homens mexicanos bebem mezcal em um bar de Oaxaca, em 2004 - Aubrey Washington/Reuters

Geoffrey Firmin é um cônsul britânico na fictícia Quauhnahuac. Vaga pelos bares da região, onde toma mezcal com a reverência de um suicida. Em delirantes monólogos interiores, balbucia o nome de Yvonne. A reconciliação é impossível. Leva o copo à boca: aquilo, sim, é real, pensa. Ele e o mundo estão na beira de um vulcão.

Muitos tentaram adaptar o livro, como Buñuel e Joseph Losey. John Huston encarou o desafio nos anos 1980. Albert Finney está inesquecível como o cônsul em sua trôpega descida ao inferno —ou inferninho. Quem sabe, Firmin está brindando com Walter White. Neste segundo.

Ah! O gusano no fundo da garrafa? Pode esquecer.

DEVIL'S SOUL

  • 30 ml de uísque de centeio (rye)
  • 15 ml de mezcal
  • 10 ml de Amaro Averna
  • 5 ml de Aperol
  • 5 ml de licor Saint-Germain

Passo a passo
Mexa os ingredientes com gelo e coe para uma taça Nick & Nora previamente gelada.

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