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Advogado, é professor de direito internacional e direitos humanos na FGV Direito SP. Doutor pela Central European University (Budapeste), escreve sobre direitos e discriminação.

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O impeachment do Rei Lear

A diferença entre o rei de Shakespeare e Bolsonaro é que um era insano e o outro sabe muito bem o que faz

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“A Pessoa do Imperador é inviolável, e sagrada: Ele não está sujeito à responsabilidade alguma”. Trata-se do artigo 99 da Constituição do Império do Brasil, de 1824. O que diferencia um presidente de um imperador é que aquele, diferente deste, é punível, seja por crime comum em função de seu cargo, seja por crime de responsabilidade. A Constituição de 1988 é clara ao mencionar os dois tipos de crimes.

Impeachment, nos ensina Rafael Mafei em seu delicioso livro “Como Remover um Presidente”, “é um mecanismo essencialmente republicano”. Foi uma das grandes inovações institucionais que separou o regime político dos EUA da monarquia britânica; que separou uma nascente democracia (com escravos) do absolutismo. Pense historicamente: à época, ser removido por impeachment soava imensamente melhor do que ser decapitado, como fora o rei da Inglaterra Charles 1º em 1649.

Ainda não houve impeachment por uma única razão: dismorfia institucional; nos olhamos no espelho e fingimos ser uma democracia capaz de processar 516 mil mortes e seus responsáveis, mas não somos. Arthur Lira concentra poder ao ignorar 120 pedidos de impeachment, vejamos se será capaz de desprezar o último superpedido. Rodrigo Pacheco concentrava poder ao ignorar a CPI da Covid, que só existe porque o STF leu a Constituição. Augusto Aras concentra poder ao aplicar a Constituição do Império, e não a de 1988.

O mesmo princípio que inventou o impeachment ilumina as atuais deformidades da nossa democracia: sobra concentração de poder, falta porosidade. Lembro aqui de Shakespeare em Rei Lear, convenientemente uma peça sobre um tirano enlouquecido: “Crês que o dever deve calar quando o poder se curva à adulação? Se um rei cai na loucura, é uma honra ser franco”. A franqueza, hoje, exige retirar o presidente, e investigar se vendeu 500 mil vidas por 5 reais cada uma. A diferença entre Lear e Bolsonaro é que um era insano; o outro sabe muito bem o que faz.

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