Siga a folha

Descrição de chapéu The New York Times tiktok

TikTok atrai espectadores em massa e ocupa espaço que era do Instagram nas artes

Muitos artistas, porém, encontram dificuldade em conservar o interesse dos usuários da rede social

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Zachary Small
The New York Times

Matthew Chessco raramente havia empunhado um pincel até aquele momento. Mas, tendo desistido de trabalhar com engenharia mecânica depois de apenas quatro dias no emprego, acabou procurando tela e pincel.

Ao longo de meses de tentativas e erros, ele poderia ter seguido o rumo tradicional e tentado formar uma parceria com uma galeria de arte para vender seus quadros. Mas, quando chegou a hora de começar a expor seus trabalhos, ele optou pelo TikTok.

Ali, seus retratos em cores néon de ícones como Bob Rossa, George Washington e Megan Thee Stallion já renderam a ele mais de 2 milhões de fãs —um número várias vezes maior que o dos seguidores no Instagram de artistas aclamados como Jeff Koons e Kehinde Wiley.

O público de Chessco clicou para apreciar sua estética inspirada em Warhol e a música que muitas vezes acompanha a criação de seus trabalhos, que pode variar de “As Quatro Estações” de Vivaldi a “Gooba”, do rapper 6ix9ine.

O Instagram está perdendo espaço, e o TikTok atraindo espectadores em massa.

A maioria das galerias mostra pouco interesse em procurar o próximo grande nome da arte na plataforma, e os críticos rejeitam sua abundância de pinturas amadorísticas em néon pop, que mais parecem arte de rua. Mas criadores como Matthew Chessco estão ganhando dinheiro substancial na plataforma, cortejando os espectadores do mesmo modo que artistas de rua faziam no Instagram quase uma década atrás.

“Um vídeo de minhas pinturas viralizou um ano atrás”, contou Chessco, de 27 anos. “De repente tive mais de 350 mil visualizações em três dias.” Ele abriu uma loja online e se tornou um dos artistas visuais mais procurados na plataforma de mídia social.

Em pouco tempo ele estava vendendo obras de arte por US$ 2.000 cada uma, formando parcerias com selos musicais e colaborando com agências publicitárias.

Chessco conta que esses contratos muitas vezes rendem quase US$ 5.000 por post na plataforma, que pertence à empresa ByteDance, sediada em Pequim. Mas o sucesso gera concorrência.

Recentemente Chessco descobriu que tem um plagiador no TikTok. Outro artista estava copiando o estilo, os temas e as músicas de seus vídeos, além de vender suas pinturas por uma fração do preço, ao lado de cópias impressas e materiais de arte, num site quase idêntico ao que Chessco usa.

Depois de postar um vídeo em fevereiro alertando seus seguidores sobre a existência de um imitador, Chessco descobriu que o artista em questão tinha bloqueado comentários em sua página e deletado seu site. Mas o imitador não demorou a reabrir sua loja online e começou a postar vídeos outra vez alguns dias mais tarde. “A concorrência é acirrada”, comentou Chessco.

Quando um vídeo de um minuto é capaz de atrair fama e fortuna, não chega a surpreender que artistas jovens andem fugindo das escolas de arte e de contrair empréstimos para pagar seus estudos, desistindo de seus empregos de sobrevivência e tentando em vez disso se lançar como artistas em tempo integral no TikTok. Mas a demanda insaciável por conteúdo, algo próprio do aplicativo, também vem afetando a estética desses artistas de maneiras inesperadas.

O que acontece quando os espectadores diminuem muito, plagiadores começam a invadir seu espaço e os fãs começam a ditar o gosto de um artista? Seus ganhos podem minguar de uma hora para outra.

Apesar da corrida para o TikTok, poucos artistas e instituições conceituados são participantes.

A galeria Uffizi, de Florença, que fez manchetes por seu uso espirituoso da plataforma, viu o engajamento dos espectadores cair consideravelmente nos últimos meses.

A fotógrafa Cindy Sherman, usuária prolífica do Instagram, disse, falando por meio de um representante, que não está interessada em trabalhar no TikTok neste momento, descrevendo a plataforma como um modismo passageiro.

Mas receber louros do mundo da arte não tem grande importância no TikTok, onde um algoritmo permite ao usuário percorrer interesses relacionados ilimitados. Pelo contrário, são os artistas sintonizados com “o momento” que ganham influência.

Para fazer sucesso é preciso trabalhos de arte capazes de chamar a atenção do espectador imediatamente, geralmente com alguma combinação de cultura da internet, anatomia humana e memes deprimentes.

É uma fórmula que funciona bem entre o público principal do TikTok —os adolescentes que compõem quase um terço dos usuários do aplicativo.

E muitos artistas no TikTok estão tendo dificuldade em conservar o interesse dos usuários.

Quando ainda era estudante, a escultora Gina D’Aloisio, de 22 anos, postou um vídeo dela própria criando uma máscara facial de silicone, estranhamente realista. O vídeo teve mais de 22 milhões de visualizações, e ela ganhou mais seguidores ainda quando compartilhou criações representando outras partes do corpo, incluindo um cinzeiro-umbigo e uma vela-pé.

E alguns artistas não brancos estão descobrindo que o sucesso pode atrair outro tipo de crítica que passa despercebido de seus colegas brancos.

Leila Mae Thompson recebeu mais de 1 milhão de visualizações de um vídeo em que anunciou sua intenção de adotar a autoconfiança dos artistas homens.

Sua ousadia rendeu frutos, com quase 300 assinantes novos vinculados à sua página no Patreon, onde fãs pagavam US$ 5 mensais para receber adesivos customizados e informações atualizadas sobre o trabalho dela.

Artista autodidata, Thompson, de Richmond, no estado americano da Virgínia, agora tem um micronegócio no TikTok em que vende pôsteres e camisetas, que rendeu quase US$ 20 mil desde agosto.

Seus temas frequentemente envolvem o movimento Black Lives Matter e reações artísticas à morte de George Floyd. O resultado disso é que alguns comentaristas a acusam de monetizar a injustiça racial, sem saber que ela se identifica como birracial e negra.

“A raça tem sido uma parte difícil de minha vida, e quando as pessoas fazem você questionar isso online, é traumático”, disse Thompson. Ela reconhece um padrão duplo em vigor numa plataforma em que o número de artistas brancos que alcançam o sucesso supera de longe o de não brancos.

Em junho o TikTok pediu desculpas depois de ser acusado de censura e supressão de conteúdos por usuários negros, muitos dos quais dizem que suas ideias foram apropriadas por criadores brancos. Mas muitas pessoas da comunidade negra do app dizem que pouca coisa mudou.

“Meu rosto não aparece em nenhum dos meus vídeos que tiveram bom desempenho”, comentou Thompson.

A volatilidade da vida no TikTok leva alguns artistas a formar grupos de apoio.

Colette Bernard, de 21 anos, escultora no Pratt Institute, do Brooklyn, em Nova York, faz colaborações frequentes com cinco outros usuários, incluindo Leila Mae Thompson. Ela procura persuadir artistas reconhecidos que manter um pé no mundo digital do TikTok e outro no cenário profissional da arte é uma coisa que pode abrir portas.

“Você pode fazer um vídeo de você mesma, acabando de sair do chuveiro e ainda com toalha enrolada na cabeça, falando de arte —coisa que eu fiz— e alcançar milhares de pessoas”, disse Bernard. “Mas artistas reconhecidos e instituições com história longa não estão interessados em revelar esse grau de naturalidade ao público.”

Desde que entrou para a plataforma, no ano passado, ela já ganhou mais de US$ 45 mil com sua loja online, concentrando seus esforços sobre artigos de preço baixo como adesivos, bijuterias e camisetas. (O Fundo de Criadores do TikTok, programa de incentivo da plataforma, recompensa alguns usuários seletos com alguns centavos de dólar por cada mil visualizações.)

“Quando eu me formar, vou trabalhar como autônoma”, disse Bernard.

Mas ela reconhece que os aspectos inconstantes do TikTok podem deixar artistas numa posição vulnerável.

“Você precisa postar todos os dias, senão as pessoas perdem o interesse”, ela contou. “E esse fato transformou totalmente o tipo de trabalho que faço. Hoje é mais sustentável para mim vender camisetas e adesivos do que as esculturas grandes que faço para a faculdade.”

Sua ansiedade chegou ao auge em janeiro, quando um problema no TikTok levou dois de seus vídeos a terem zero visualizações. Ela havia investido mais de US$ 20 mil em seus produtos. “Se não venderem, estou ferrada.”

Mas no final de fevereiro, Bernard estava subindo outra vez na montanha-russa do TikTok. Outro de seus vídeos havia viralizado, e fãs haviam desembolsado quase US$ 10 mil em sua loja online em um dia apenas.

Tradução de Clara Allain

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas