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Financiamento coletivo vira saída para viabilizar exposição de arte

Após polêmicas, 'Queermuseu' recorreu a show beneficente de Caetano Veloso e estreará em junho

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Daniel Rangel

A exposição "Queermuseu: Cartografias da Diferença na Arte Brasileira", que foi motivo de grande polêmica e pivô de uma discussão nacional sobre a liberdade de expressão artística, está programada para acontecer a partir da segunda quinzena de junho no espaço expositivo da Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro.

Acompanhando as reações de algumas pessoas que leram a notícia sobre a abertura do Queermuseu no Rio, já é possível perceber a preparação de um novo campo de batalha em torno do projeto a ser realizado em solo carioca.

Contudo, dessa vez a exposição não virá chancelada somente por uma instituição e pelo sistema da arte, pois contará também com o apoio de 1.678 pessoas que estão literalmente financiando a exibição.

As campanhas de financiamento coletivo pela internet, conhecidas como crowdfunding, vêm se intensificando em todo o mundo. No Brasil, até meados de 2017, mais de R$ 200 milhões tinham sido doados em plataformas online desse tipo, dos quais R$ 60 milhões somente no ano de 2016.

O recorde dessa modalidade no país veio justamente na captação da "Queermuseu" no Rio de Janeiro: pouco mais de R$ 1 milhão.

A campanha teve um toque de excepcionalidade por contar com a colaboração de um show beneficente de Caetano Veloso e de um leilão de obras doadas por artistas, mas ainda assim indica um caminho: o financiamento coletivo é uma possível saída para que artistas, curadores e instituições viabilizem seus projetos, principalmente aqueles cujos conteúdos são considerados menos interessantes pelos departamentos de marketing de eventuais patrocinadores.

Show beneficente de Caetano Veloso no Parque Lage - Reprodução

Aliás, o número de empresas que atualmente apoiam a cultura no Brasil é bem pequeno e, infelizmente, vem diminuindo, na contramão da proposta da Lei Rouanet, de 1991.

Concebida com o intuito de criar o hábito de patrocínio cultural nas empresas, a Lei Rouanet tornou-se o principal instrumento de fomento dessa área no país. Apesar de ter sido pensada inicialmente como um estímulo temporário, hoje ela é vital para que instituições, produtores e artistas realizem seus projetos.

Entretanto, as crises políticas e financeiras que vêm desestruturando instituições e empresas e abalando o sistema democrático no país fizeram com que os patrocínios incentivados pela lei caíssem vertiginosamente nos últimos anos.

A Petrobras, por exemplo, que era a principal doadora da Lei Rouanet durante muitos anos, está mergulhada numa crise de gestão e, desde 2014, não abre o edital de seleção do Programa Petrobras Cultural, um dos principais financiadores de importantes projetos culturais até então.

No ano passado, nem o tradicional edital de ocupação de espaços da Caixa Cultural foi aberto, com a alegação de uma mudança no sistema de inscrições online.

Projetos escolhidos em outros editais correm o risco de não serem realizados. É o caso da mostra de Haroldo de Campos, que passou por seleção do Centro Cultural Banco do Brasil em 2017, estava pré-agendada para julho deste ano, mas foi postergada pela instituição, ainda sem data definida, sob alegação de falta de recursos.

A realidade atual demanda que os artistas sejam criativos, não somente na execução de suas obras mas também na busca por meios de produção, exibição, registro e difusão de seus trabalhos.

Além da "Queermuseu", ainda são poucas as campanhas de arrecadação para projetos de artes visuais: pequenas mostras, publicações de livros de artistas e viagens para participação em residências e exposições no exterior estão entre os projetos disponíveis nos principais sites de arrecadação online.

Em contrapartida, as áreas de música, teatro e cinema possuem inúmeros projetos em captação nas redes colaborativas —ao que parece, conquistam com mais facilidade seguidores e fãs dispostos a ajudar.

No entanto, o exemplo da "Queermuseu" deve ser seguido por outros. Instituições e eventos de arte que possuem o potencial de atrair uma grande quantidade de público ou que defendem causas específicas devem estar atentos a essas oportunidades.

Quem sabe um dia teremos uma Bienal de São Paulo financiada inteiramente pelas pessoas. Ou a programação de um Masp, por exemplo. Isso liberaria a verba das empresas para projetos com menos apelo de marketing, propiciando maior democratização dos recursos.

E, seguramente, artistas, produtores, curadores e instituições culturais irão agradecer pela liberdade que esse tipo de financiamento proporciona. Você colaboraria? 


Daniel Rangel, curador, faz mestrado em poéticas visuais na Escola de Comunicações e Artes da USP.

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