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Investigado, George Santos gastou quase R$ 500 mil em viagens e aluguel em campanha

Deputado trumpista eleito nos EUA, filho de brasileiros, teve gastos altos e despesas incomuns para midterms

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Grace Ashford Dana Rubinstein
Nova York | The New York Times

A empresa se chamava Cleaner 123, e ao longo de quatro meses recebeu quase US$ 11 mil (R$ 57,3 mil) da campanha de George Santos, o deputado eleito de Nova York que parece ter inventado trechos inteiros de sua vida.

As despesas foram listadas como "aluguel de apartamento para funcionários" nos formulários de divulgação da campanha de Santos e davam o endereço de uma modesta casa suburbana em Long Island, no estado de Nova York. Mas um vizinho disse que o próprio Santos morava lá havia meses, e outros dois contaram ter visto Santos e seu marido entrando e saindo, numa possível violação da regra que proíbe o uso de verbas de campanha para despesas pessoais.

George Santos durante campanha para o Congresso nos Estados Unidos - Divulgação George Santos/Reuters

Os pagamentos à Cleaner 123 estavam entre uma série de despesas incomuns documentadas nos arquivos da campanha de Santos, que, segundo especialistas, poderiam justificar um exame mais minucioso. Há também dezenas de despesas atreladas de US$ 199,99 (R$ 1.043), 1 centavo a menos do valor para o qual a lei federal exige recibos.

As despesas incluem mais de US$ 40 mil (R$ 208,6 mil) em viagens aéreas, número tão exorbitante que se assemelha aos registros de campanha de líderes partidários no Congresso, e não de um congressista recém-eleito que ainda está se apresentando aos eleitores locais.

Não se sabe se o gasto foi de fato ilegal ou apenas incomum. Promotores federais e locais disseram nesta semana que vão iniciar investigações sobre as finanças e os antecedentes de Santos.

O republicano foi eleito no 3º Distrito Congressional, em Queens e Long Island, depois de uma tentativa fracassada para a mesma cadeira em 2020. Ele está sob intenso escrutínio depois que uma investigação do jornal The New York Times revelou que ele distorceu detalhes de seu currículo acadêmico, histórico profissional e propriedades, além de uma acusação criminal no Brasil, não divulgada anteriormente.

A reportagem também levantou questões sobre sua situação financeira, que as informações mostram ter melhorado drasticamente desde 2020, quando ele relatou ganhar apenas US$ 55 mil (R$ 287 mil) por ano.

Santos não quis dar entrevista. Mas nos dez dias desde que a reportagem foi publicada ele admitiu uma impressionante série de falsidades. No início desta semana, disse ao jornal The New York Post que nega qualquer conduta criminosa: "Meus pecados aqui são florear meu currículo".

Na noite de quinta-feira (29), Joe Murray, advogado de Santos, disse em comunicado que algum dinheiro foi gasto "imprudentemente" por uma empresa que tinha sido demitida pela campanha há mais de um ano, mas que todos os gastos foram legais. Os pagamentos à Cleaner 123 foram para despesas legítimas em nome dos funcionários que se mudaram para o distrito, disse ele, assim como hotéis reservados para hospedar funcionários e pessoas que auxiliaram na campanha.

"Despesas de campanha para membros da equipe, incluindo viagens, hospedagem e refeições, são despesas normais de qualquer campanha competente. A sugestão de que a campanha de Santos se envolveu em qualquer gasto irresponsável de fundos é simplesmente ridícula", afirmou.

Santos deverá tomar posse no Congresso na terça-feira (3), quando os republicanos iniciarão um novo mandato com uma pequena maioria na Câmara. Enquanto os líderes republicanos locais condenaram as dissimulações de Santos, os de Washington permaneceram em silêncio.

Surgiram dúvidas sobre sua residência quando um repórter tentou contatá-lo em Whitestone, no Queens, endereço listado em seu registro eleitoral. O ex-locador disse que Santos tinha se mudado em agosto.

Santos disse ao Post que estava morando em Huntington, em Long Island, na casa da irmã. Mas documentos judiciais, bem como entrevistas com vizinhos e um porteiro, mostram que ela mora em Elmhurst, no Queens.

As divulgações da campanha, no entanto, mostram que Santos pagou à Cleaner 123, que cita como endereço a casa em Huntington, quase US$ 11 mil (R$ 57,3 mil) em aluguéis e um depósito. Ao ser contatado por telefone, um representante da Cleaner 123 confirmou que se tratava de uma empresa de limpeza, mas desligou antes de responder por que recebia o aluguel de Santos

Muitas questões permanecem sobre os gastos da campanha: não está claro quais foram feitos em nome da equipe ou para o próprio candidato. Regras da Comissão Eleitoral Federal (FEC) dizem que as campanhas não podem pagar despesas pessoais dos candidatos. Especialistas dizem que pagar aluguel para funcionários é incomum e pode ser uma violação, embora apontem que a FEC raramente age nesses casos.

Os arquivos de campanha de Santos mostram outras irregularidades: ele listou uma enxurrada de despesas abaixo de US$ 200 —mais de 800 itens—, número que supera em muito o de candidatos a cargos semelhantes. Mais de 30 delas ficaram logo abaixo do limite, em US$ 199,99, listados como material de escritório, restaurantes e Uber. Embora as regras da FEC exortem candidatos a guardar recibos de compras abaixo de US$ 200, eles só são obrigados a mantê-los para as despesas acima desse valor.

Ao longo da campanha, Santos gastou US$ 30 mil (R$ 156,5 mil) em hotéis, US$ 40 mil (R$ 208,6 mil) em passagens aéreas e US$ 14 mil (R$ 73 mil) em serviços automotivos —e os registros sugerem que ele também manteve um veículo de campanha.

Os gastos foram financiados por um fundo de mais de US$ 3 milhões (R$ 15,6 milhões), acumulado por quatro comitês de arrecadação durante o ciclo eleitoral de 2022. O dinheiro veio de pequenos doadores, antigos contribuintes republicanos em Long Island e outros lugares e comitês de campanha de outros candidatos republicanos. Os maiores doadores beneficiaram Santos com as quantias máximas permitidas, em alguns casos diretamente, em outros por meio de um super PAC (comitê de ação política) republicano ou do Comitê Nacional Republicano de Campanha ao Congresso.

Craig Holman, lobista de assuntos governamentais do grupo de defesa do consumidor Public Citizen, vê os gastos como atípicos. "Geralmente, um candidato a deputado tenta gastar o mínimo possível em hospedagem e viagens, porque precisa desse dinheiro para fins de campanha", diz. "George Santos parece estar apenas vivendo um estilo de vida luxuoso."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves 

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