Café na Prensa

Tudo sobre a bebida, do grão à xícara

Café na Prensa - David Lucena
David Lucena
Descrição de chapéu alimentação

Café na xícara, caneca ou copo americano? Recipiente muda percepção do sabor

Bebida pode parecer mais doce, ácida ou aromática a depender de onde é servida, revela pesquisa

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São Paulo

Há quem não dispense uma xícara com pires na hora de tomar um cafezinho. Outros preferem uma caneca grande, para ingerir a bebida aos montes. Tem ainda os defensores ferrenhos do copo americano, onipresente em lanchonetes de bairro.

Frequentemente o argumento para a escolha de um ou outro recipiente é meramente passional e não vai além de preferências pessoais ou razões estéticas.

Mas uma pesquisa mostrou que o copo em que o café é consumido afeta a percepção que a pessoa tem sobre a bebida. A depender do formato e tipo de xícara, o consumidor pode sentir o mesmo café como mais doce, mais ácido ou mais aromático, por exemplo.

Caneca, copo americano e xícara sobre fundo preto e branco
Escolha do copo afeta como percebemos os sabores e aromas do café - David Lucena/Folhapress

O estudo acerca das diferentes taças já é extenso no meio dos vinhos e até das cervejas, que são bebidas milenares. Mas no mundo do café, ainda é escassa a literatura sobre o assunto.

Por isso, a neurocientista brasileira Fabiana Carvalho, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), conduziu uma pesquisa em que o mesmo café, preparado da mesma maneira, foi servido em três xícaras de materiais, cores, texturas e alturas iguais, mas com formatos diferentes.

Participaram do experimento mais de 200 pessoas, entre amadores e degustadores especializados.

As xícaras foram concebidas pelo norueguês Tim Wendelboe, considerado um dos maiores baristas do mundo, em parceria com a fabricante de porcelana Figgjo, e foram validadas pelo The Coffee Sensorium, núcleo de pesquisas sobre café liderado por Carvalho.

Uma xícara era em formato de tulipa; outra tinha a boca mais aberta; e a terceira possuía uma curva no meio e boca larga.

Três xícaras brancas de mesma altura e formatos diferentes; uma tem formato de tulipa; outra tem a boca mais aberta; e a terceira tem uma curva no meio e boca larga
Xícaras usadas no experimento conduzido pela pesquisadora Fabiana Carvalho - Divulgação

Os participantes afirmaram que perceberam mais notas de doçura e acidez quando ingeriam o café do terceiro modelo de xícara, mas achavam ele mais aromático quando servido no copo com formato de tulipa.

Diante disso, Wendelboe, dono de uma das cafeterias mais conceituadas do mundo, em Oslo, serve seus cafés em cada um dos três tipos de copo a depender do perfil de cada café, de modo a realçar certas notas sensoriais.

Assim, quando quer destacar as notas frutadas e cítricas de determinado grão, serve em um modelo de xícara; para bebidas mais adocicadas, outro modelo.

A escolha da louça, contudo, não pode ser vista como uma forma de tentar mascarar defeitos ou de elevar a qualidade da bebida, afirma a pesquisadora.

"Se eu colocar um café ruim na xícara, ele vai continuar ruim [independentemente do modelo]. Eu vou elevar a percepção de certos atributos, de certas notas, do corpo, do aroma, doçura", explica Carvalho.

COPO AMERICANO E CANECA COM VALOR SENTIMENTAL

A percepção sensorial, contudo, não é a única maneira pela qual a louça interfere na maneira como a pessoa aprecia (ou não) o café.

É possível analisar o efeito em três níveis. Há a percepção sensorial, já mencionada, na qual o consumidor percebe o café como mais amargo, doce ou aromático, por exemplo.

Outro nível é o julgamento afetivo ou hedônico, que consiste basicamente no gostar ou não gostar, no mero prazer que você sente ao usar um tipo de xícara.

E o outro nível é a percepção simbólica, isto é, o que aquela louça representa. Pelo design, ela pode comunicar uma sofisticação e elegância, por exemplo. Ou pode ser uma xícara que represente tradição e conforto.

Ou seja, é possível que uma caneca ou copo americano não contribuam para uma boa percepção sensorial da bebida, por não possuírem formatos que realcem certas notas do café, mas ainda assim deem um prazer maior do que as xícaras mais apropriadas para aquele tipo de café, pois podem carregar certos atributos hedônicos ou simbólicos.

É por isso que não se pode idolatrar nem vilanizar o copo americano da lanchonete, a xícara velha da casa da avó ou a cerâmica sofisticada de design nórdico.

Nem sempre o café é degustado com calma, em um ambiente relaxante e numa xícara com valor sentimental. Às vezes, ele entra no dia a dia como mero acompanhante do pão na chapa, servido no tradicional copo americano. Ou entre uma reunião e outra, engolido às pressas de um copinho de papel que nem tem tempo de desmanchar.

Cada momento, um copo. Capa copo, um sabor. O café pode até ser o mesmo, mas você o perceberá diferentemente.

Acompanhe o Café na Prensa também pelo Instagram @davidmclucena e pelo Twitter @davidlucena

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