Cozinha Bruta

Comida de verdade, receitas e papo sobre gastronomia com humor (bom e mau)

Descrição de chapéu alimentação

Bares e restaurantes para gente burra

Sempre deu dinheiro esculachar e achincalhar um certo tipo de cliente que paga pela humilhação com um sorriso no rosto

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Londres

Tomávamos uma cerveja embaixo da linha do trem em Brixton, no sul de Londres.

Ali já foi uma região barra-pesada. Gentrificou. Encheu de londrinos de outras partes, que chegam para pagar aluguel mais barato, abrir bares modernosos e fazer o aluguel subir.

É tipo uma Barra Funda inglesa.

Garçonete de braços cruzados em frente a mesa com uma família sentada
O Karen's Diner, nascido na Austrália, maltrata burros em cinco países com garçons propositalmente malcriados - Reprodução/Facebook

O lugar em que bebíamos é um brewpub –bar que produz a própria cerveja– instalado num arco da ponte que sustenta a ferrovia. Apenas um sujeito trabalhava lá, provavelmente o dono.

Os clientes ficam na calçada. Outra mesa de armar, além da nossa, conversava animadamente. Era o primeiro sábado de outono, um dia ensolarado e agradável. Cerveja boa.

"Tá vendo? Esse tipo de coisa não existe em São Paulo", disparou Rogério. Fomos colegas de faculdade. Ele é paulistano, mas tem até cidadania britânica. Mora aqui, entre idas e vindas, há mais de 20 anos.

Rogério argumentou que, em São Paulo, os lugares são caídos ou insuportavelmente cheios. Todo mundo quer estar onde todo mundo está.

Tremenda amargura do amigo com a cidade natal. Em bairros como Vila Mariana, Lapa ou Perdizes, sobram estabelecimentos bacaninhas –nada espetaculares, como tampouco é a cervejaria de Brixton– frequentados por quem mora perto.

Se Rogério foi injusto ao apontar São Paulo como capital da jequice, sua queixa se aplica ao comportamento humano em geral. Somos irremediavelmente burros. Meio bovinos. Seguimos a manada sem saber por quê.

Vejo bastante disso aqui em Londres.

São os bandos que descem dos ônibus fretados de dois andares para comprar cinzeiro com a cara da rainha Elizabeth. As arapucas abarrotadas de turistas em Covent Garden. A massa de gente descolex que espera horas para comer pão com alguma coisa no Borough Market.

Todo mundo age feito burro de vez em quando, mas alguns excedem a cota.

Como os otários que pagam para pastar num certo Karen’s Diner, cadeia de origem australiana, cujos garçons são atores treinados para tratar mal a clientela –atiram a comida na mesa, trocam pedidos de propósito, bufam e mostram o dedo do meio.

É teatro, rudeza instagramável. Outra modalidade de estabelecimento investe na grosseria raiz, autêntica, que vem de pai para filho.

Tem churrasqueiro que acha legal bancar o adolescente malcriado. Velho japonês dando chilique quando pedem o shoyu. Lugar que não substitui ingrediente porque quem manda aqui é o chef, porra, se quiser comida do seu jeito vai cozinhar na sua casa.

E tem gente que faz fila para deixar uma grana nesses lugares.

Fila é uma isca infalível de gente burra. Tá cheio de dono de restaurante que usa a fila como selo de aprovação. Que conduz a operação para sempre ter fila e, assim, aumentar a fila.

Os empresários sabem que dá dinheiro esculachar e achincalhar esse tipo de freguês. Não é à toa que quase toda cidade brasileira tem um Bar dos Cornos.

Estou pensando seriamente em abrir um boteco temático de gente burra, chamado Cantinho dos Burros. Só falta achar um trouxa para investir dinheiro nessa barca furada.

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