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Luiza Pastor

Aumenta a demanda por turismo de aventura no Brasil

Ministério do Turismo prepara relatório sobre parques e trilhas do país

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Desde antes de a pandemia prender todo mundo entre quatro paredes, a demanda por turismo de aventura e ecoturismo já apresentava uma curva de crescimento mais ou menos acentuada em todo o mundo. Pesquisas feitas pelo Cifs (sigla em inglês para o Instituto Copenhague de Estudos Futuros) apontam que, desde o início da década passada e com o envelhecimento das populações aliado à excessiva digitalização do dia a dia, a procura por destinos com um perfil menos urbano, em todo o mundo, só tende a aumentar. No Brasil, não é diferente.

De acordo com dados do Ministério do Turismo, viagens para a natureza ou o ecoturismo foram a preferência de 25,6% das viagens domésticas a lazer contabilizadas em 2021 —ou seja, assim que as porteiras do isolamento social começaram a se abrir. Entre os turistas internacionais, 18,6% declararam, em 2019, que vinham ao país motivados por destinos desse perfil ou mesmo de aventura, "o maior índice dos últimos cinco anos", como conta Fabiana Oliveira, coordenadora-geral de Produtos e Experiências Turísticas do ministério.

Fabiana de Oliveira, coordenadora-geral de Produtos e Experiências Turísticas do Ministério do Turismo
Fabiana de Oliveira, coordenadora-geral de Produtos e Experiências Turísticas do Ministério do Turismo - Divulgação

As informações disponíveis, entretanto, podem ser bem mais tímidas do que a vida real. Isso porque, segundo a Abeta (Associação Brasileira das Agências de Ecoturismo e Turismo de Aventura), a informalidade dos negócios que operam com esse segmento é estimada em torno dos 70%, entre guias, pousadas informais e agentes locais.

"Só temos a certeza de que o crescimento da demanda por turismo de aventura foi atípico, surpreendente até, porque associados nossos nos procuraram preocupados porque lugares em suas regiões que recebiam dez, vinte visitantes em um fim de semana, de repente passaram a receber 100 ou 200, gerando problemas para os municípios tanto de lixo e demanda maior que a oferta, como de segurança dos próprios visitantes para a qual eles não estavam preparados para atender", conta Luiz Del Vigna, da associação e também pesquisador do Cifs.

Homem idoso olhando para cima, com pão de açúcar ao fundo
Luiz Del Vigna diretor da Abeta - Divulgação

De olho nessa demanda, o Ministério do Turismo, em parceria com o do Meio Ambiente, com a Embratur e o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), está finalizando um relatório sobre as unidades de conservação do país, focando principalmente os parques nacionais. Mas também corre em paralelo outra parceria com a Rede Brasileira de Trilhas de Longo Curso, inspirada no modelo norte-americano da Appalachian Trail, ou Trilha Apalache, a mais longa e sinalizada trilha do planeta, que percorre 3.500 quilômetros por 14 estados da costa leste dos Estados Unidos entre os estados de Geórgia e Maine.

"Buscamos adaptar o conceito à realidade brasileira", explica Fabiana, acrescentando que já há 250 trilhas de longo curso implementadas no país, somando 15 mil quilômetros, identificadas. E, até junho próximo, o ministério prevê lançar o Boletim Trilhas do Brasil, com as informações de algo entre 30 e 40 trilhas que já contam com a sinalização padrão das pegadas amarelas, mais o símbolo que caracteriza cada uma, e informações ao turista sobre percurso, características e outros dados essenciais para que cada um escolha seus perrengues.

Pegada pintada numa árvore
Marca que sinaliza a trilha Transmantiqueira aplicada a árvore do percurso para orientação do caminhante - Hugo de Castro/Divulgação

Além disso, no âmbito sulamericano, a ministra do Turismo, Daniela Carneiro, apresentou no início do ano, em parceria com Argentina, Paraguai, Uruguai e Chile, a marca "Visit South America: um lugar, vários mundos", que segundo a pasta busca "de forma integrada, promover e posicionar internacionalmente os destinos destes países, com foco em atrativos naturais, gastronômicos e de hospitalidade". Especificamente no segmento turismo de natureza, foi definida a criação de uma rota integrada, incluindo destinos naturais dos países do Mercosul, da Bolívia e do Chile, por meio da "Rota Natural do Sul".

Apesar da iniciativa de promover esse perfil de turismo, a pasta não conta com qualquer avaliação do impacto econômico que ele pode representar. "Não há, em nenhum órgão federal, ainda, uma cultura voltada para a contabilização desse perfil de impacto", admite Fabiana, contando com o exemplo de iniciativas internacionais.

Entre esses casos internacionais, com certeza, destaca-se o Caminho de Santiago, na Espanha, que em 2022 registrou um número recorde de seis milhões de peregrinos percorrendo parte ou todos os mais de 800 quilômetros, dos montes Pirineus, na fronteira com a França, até a cidade de Santiago de Compostela. De acordo com dados da Federação dos Amigos do Caminho de Santiago, em 2018, antes mesmo do recorde, a trilha mais famosa da Europa já representou mais de 280 milhões de euros (aproximadamente R$ 1,5 bilhão no câmbio atualizado) anuais —e só cresce. E sabem do mais interessante? Peregrinos brasileiros são o quinto maior contingente por nacionalidade dessa multidão.

"Nós queremos que esse caminhante fique no Brasil, que percorra nossas trilhas", diz Hugo de Castro, presidente da Rede Brasileira de Trilhas de Longo Curso. "Temos tudo para isso, natureza rica, boa comida, talvez ainda não vinhos tão bons, mas estamos chegando lá", brinca ele.

Hugo de Castro, presidente da Rede Brasileira de Trilhas de Longo Curso - Luiz Aragão/Divulgação

Castro lembra ainda que, nos Estados Unidos, as atividades de natureza, segundo o Departamento de Comércio norte-americano, movimentaram em 2019 cerca de US$ 460 bilhões (R$ 2,3 trilhões), ou 2,1% do PIB (Produto Interno Bruto) do país, uma participação maior do que setores como mineração e indústria química. A Trilha Apalache aí de cima, sozinha, movimentou US$ 4 bilhões (R$ 20 bilhões) naquele ano.

"A grande tendência em todo o mundo é mesmo o slow travel, o detox digital por meio do contato com a natureza", ressalta Castro, lembrando que é esse turista diferente, que não procura os circuitos tradicionais urbanos, que acaba capilarizando os recursos de forma mais intensa. "A abrangência de seus gastos é muito maior do que aquela do turista de fim de semana, porque quem está numa trilha de longa distância vai gastando em lugares e serviços agregados que não são contemplados nos roteiros tradicionais", acrescenta.

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