Era Outra Vez

Literatura infantojuvenil e outras histórias

Era Outra Vez - Bruno Molinero
Bruno Molinero
Descrição de chapéu Livros

Baratas e porcos ganham ares de fofura em novos livros de autoras brasileiras

Inseto e suíno sonhadores guiam 'A Barata Bailarina', de Rosinha, e 'As Aventuras de Vitório', de Veridiana Scarpelli

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Quando falamos de bicho, o universo dos livros para crianças às vezes parece uma fazendinha só com cachorros fofos, gatinhos felpudos, oncinhas-pintadas, zebrinhas listradas e coelhinhos peludos. Mas é só a aparência.

A história da literatura infantojuvenil é formada também por toda uma fauna de animais vistos como sujos, perigosos, nojentos e marginais pelo senso comum. São ratos, porcos, baratas, aranhas e outras espécies que geralmente acabam se mostrando personagens para lá de interessantes, já que são capazes de produzir um dos efeitos literários mais eficazes —a quebra de expectativas.

Ilustração de 'As Aventuras de Vitório', de Veridiana Scarpelli
Protagonista de 'As Aventuras de Vitório', da ilustradora Veridiana Scarpelli - Divulgação

Afinal, a gente espera ver um porco sujo e besuntado de lama, mas o Marquês de Rabicó ostenta um título de nobreza em "Reinações de Narizinho", de Monteiro Lobato, por exemplo. Não é preciso se estender aqui sobre a má fama das baratas, só que a famosa Carochinha "tem fita no cabelo e dinheiro na caixinha" pelo menos desde 1894, quando Alberto Figueiredo Pimentel publicou "Contos da Carochinha", tornando-se quase sinônimo de literatura infantojuvenil no Brasil. A lista das surpresas continua e é quase infinita.

Esses estranhamentos —ou desfamiliarizações, como alguns preferem chamar— costumam pegar os leitores no contrapé e ser o pulo do gato (ou do rato, se quisermos entrar na brincadeira) de muitas histórias. É o caso de dois lançamentos para crianças pequenas que acabam de chegar às livrarias.

O primeiro é "As Aventuras de Vitório", no qual a ilustradora Veridiana Scarpelli conta a história do porco que dá título ao livro em três partes, sempre com ilustrações multicoloridas e nenhuma palavra.

Com todas as patas no nonsense, as narrativas visuais estão recheadas de surpresas. Pode esquecer a ideia do porco imundo ou os clichês ligados a "Os Três Porquinhos". Vitório é fofo, veste uma camisetinha listrada e participa de aventuras com um misto de coragem, curiosidade e inocência.

Ilustração de 'As Aventuras de Vitório', de Veridiana Scarpelli
Vitório mergulhando no primeiro capítulo do livro - Divulgação

Na primeira das histórias, chamada "O Sonho", ele fica pelado, mergulha num oceano escondido numa poça d'água e participa de uma festa fantasiado de coelho —todos sabemos o significado da expressão "lobo em pele de cordeiro", mas o que quer dizer um porco em pele de coelho? Em "A Viagem", o leitão transforma um teco de grama em asas e explora os cantos mais malucos do universo. Já em "O Sorvete", Vitório sai em busca de um picolé cor-de-rosa, mas confunde a sobremesa com o chapéu de uma raposa, a nave espacial de um ratinho e o guarda-sol de uma turma de sapos.

Tudo é inesperado, criativo, bem-humorado. Scarpelli aproveita ainda para criar narrativas visuais espelhadas, já que o protagonista sempre começa e acaba cada capítulo do mesmo jeito. Ou quase, pois as cenas têm pequenas diferenças. São essas variações que convidam crianças a brincar de jogo dos sete erros, enquanto adultos param para refletir sobre nossos inícios e fins.

Já o segundo lançamento traz um bicho que gera um pouco mais de aflição. É estranho dizer isso, mas dá vontade de apertar a protagonista de "A Barata Bailarina", novo livro de Rosinha —e não é apertar até esmagar e matar, muito pelo contrário.

A autora parte da conhecida cantiga popular sobre a barata dizer que tem sete saias de filó. Todo mundo sabe que é mentira da barata e que ela tem uma só. Até aí tudo bem, mas por que ela conta essa lorota?

A obra vai brincando com a música famosa, com a personagem acrescentando que tem sapatilhas de cetim, meia-calça cor-de-rosa, o cabelo penteado e outras coisas que não fazem parte da versão original. Enquanto isso, as ilustrações exibem o inseto se vestindo e se preparando com todo o cuidado.

Ilustração de 'A Barata Bailarina', de Rosinha
A personagem principal de 'A Barata Bailarina', de Rosinha - Divulgação

É uma pena que o título já entregue o grande sonho da barata logo de cara, que é ser bailarina. Talvez o estranhamento e a surpresa fossem maiores se só descobríssemos o seu desejo no fim, como uma revelação. Mas, de qualquer forma, o inseto dançarino esbanja graça e leveza do começo à última página.

E, de quebra, faz um complemento a outra música, "Ciranda da Bailarina", de Chico Buarque e Edu Lobo. A letra da dupla diz que todo mundo tem coceira, piolho, remela, piriri e pentelho, por exemplo, mas só a bailarina não tem. No livro, a barata bailarina tem pé de capim, perna espinhosa e casca dura —e tudo bem, porque ela dança mesmo assim.

As Aventuras de Vitório

  • Preço R$ 74,90 (72 págs.)
  • Autoria Veridiana Scarpelli
  • Editora Companhia das Letrinhas

A Barata Bailarina

  • Preço R$ 53,10 (32 págs.)
  • Autoria Rosinha
  • Editora Editora do Brasil

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