Era Outra Vez

Literatura infantojuvenil e outras histórias

Era Outra Vez - Bruno Molinero
Bruno Molinero
Descrição de chapéu Livros

Malasartes, livraria infantil mais antiga do Brasil, fecha as portas no Rio de Janeiro

Inaugurada em 1979, loja teve Ana Maria Machado como sócia e fez lançamento do primeiro infantojuvenil de Chico Buarque

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Um capítulo da história do livro infantojuvenil brasileiro e do próprio mercado editorial do país será encerrado na próxima semana. A Malasartes, mais antiga livraria infantil em funcionamento no Brasil, irá fechar as portas na quarta-feira, dia 31, no Rio de Janeiro.

Aberta desde 1979 no shopping da Gávea, a loja reúne há 45 anos gerações de escritores, ilustradores e crianças num espaço recheado de mesinhas baixas, estantes coloridas e curadoria afiada de títulos.

Fachada da livraria Malasartes, no Rio de Janeiro
Fachada da livraria Malasartes, que fecha as portas no Rio de Janeiro - Divulgação

"Nós pavimentamos o caminho de ter um espaço lúdico, com almofadas, cores alegres, máquinas de escrever à disposição das crianças. E principalmente com uma curadoria atenta, que se recusava a trabalhar com bobagens descartáveis", afirma a escritora Ana Maria Machado, uma das fundadoras do espaço. "Nunca dividimos as estantes por faixa etária, por exemplo, por não acreditar que crianças de uma mesma idade sejam iguais."

A Malasartes nasceu de uma parceria entre Machado, que ainda trabalhava como jornalista naquela época, e a contadora de histórias Maria Eugênia da Silveira. Em seguida, a psicóloga Renata Moraes se juntou à dupla. Mais tarde, após a saída de Silveira, entraram na sociedade a irmã e a mãe de Renata, Claudia Amorim e Yacy Mattos de Moraes, respectivamente.

O batismo veio pouco depois da inauguração. Naquele mesmo ano de 1979, a livraria foi o local escolhido por Chico Buarque para lançar "Chapeuzinho Amarelo", seu primeiro livro para crianças. A sessão de autógrafos durou horas, com filas pelos corredores e congestionamento nas ruas, colocando a Malasartes no mapa cultural carioca.

"O lançamento do Chico foi muito importante, porque teve uma cobertura tremenda da mídia e foi logo no nosso começo", relembra Machado. "Mas os moradores da Gávea já tinham descoberto a loja. O shopping tinha três teatros, todos com peças infantis em cartaz, e nós ficávamos na porta anunciando a livraria."

Ilustração de "Chapeuzinho Amarelo" feita por Ziraldo
Ilustração de "Chapeuzinho Amarelo" feita por Ziraldo

Autora de clássicos como "Bisa Bia, Bisa Bel", integrante da Academia Brasileira de Letras e vencedora do prêmio Hans Christian Andersen, considerado o Nobel da literatura infantojuvenil, Machado foi sócia da Malasartes até 1997. Depois, o espaço ficou com Renata Moraes, Claudia Amorim e Yacy Mattos de Moraes, que morreu em 2018. Atualmente, apenas Renata segue na loja.

Curiosamente, o local foi inaugurado simultaneamente a outra histórica livraria especializada em livros infantis —a Miguilim, fundada por Maria Antonieta Antunes Cunha em Belo Horizonte.

"A Miguilim e a Malasartes foram inauguradas no mesmo dia e no mesmo ano, em setembro de 1979. Pura coincidência, não teve nada combinado, ninguém se conhecia nem nada", conta o escritor Leo Cunha, filho de Maria Antonieta. "Elas puxaram esse movimento. Em São Paulo, por exemplo, ainda não tinha livraria para a infância naquela época."

Um ano após a inauguração, a Miguilim passou a ser também editora, deixando tempos depois de funcionar como livraria. A criadora do espaço fez parte da equipe da casa editorial até o início dos anos 1990. Hoje, aos 85 anos, ela é membro da Academia Mineira de Letras.

Já a Malasartes não sobreviveu à crise que afeta livrarias físicas pelo país, agravada com a pandemia. Segundo a empresa, as vendas chegaram a cair 70% durante o isolamento causado pela Covid-19. A concorrência com plataformas online e os alto valores pagos pelo ponto dentro do shopping acabaram inviabilizando o negócio.

Vale lembrar que a venda de livros como um todo diminuiu 8% no Brasil em 2023, com um faturamento 5% menor para as editoras, de acordo com uma pesquisa feita pela Nielsen em parceria com a Câmara Brasileira do Livro e o Sindicato Nacional dos Editores.

A partir do dia 31, quando a Malasartes fechar as portas, outras livrarias infantis serão responsáveis por continuar o seu legado. É o caso da Pequeno Benjamim, no Rio de Janeiro. Em São Paulo, da NoveSete, da PanaPaná e da Companhia Ilimitada, por exemplo, além de endereços mais recentes, como a Miúda, a Pé de Livro e A Banca de Livros, entre outros.

"Creio ser perfeitamente possível haver livrarias infantis de qualidade resistindo no Brasil. E há. Confio nelas", diz Ana Maria Machado.

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